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História da Homossexualidade – Parte I

Arthur Virmond de Lacerta Neto 10 de Outubro, 2007 01h51m

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Nesta série de artigos, tratarei da história da homossexualidade, com base, exclusivamente, no livro de Willian Naphy, “Born to be gay. História da homossexualidade”, na sua tradução portuguesa, de Jaime Araújo, publicado pelas Edições 70, em 2006, em Lisboa. Não há, da minha parte, nenhuma pesquisa, porém simples condensação, no intuito de divulgar o tema de que trata o livro e o respectivo conteúdo. Neste primeiro artigo, ocupo-me dos dois capítulos iniciais do livro.

Anteriormente às leis emitidas por Moisés, em nome da sua divindade, em poucas culturas havia preocupações com as relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo. Antes da instituição do monoteísmo no Oriente Próximo, os fiéis das religiões orientais abundavam em todos os tipos de atividade sexual e os deuses correspondentes exerciam-na: assim, Osíris, no Egito; Istar, na Babilônia, El, em Canaã; Crixna, na Índia; também na Índia, Samba, era bissexual, como Zeus e Apolo, na Grécia (Apolo enamorou-se de Jacinto, o que despertou ciúmes em Zéfiro, que provocou a morte de Jacinto, consternado com a qual, Apolo transformou Jacinto em uma flor).

Os cultos correspondentes envolviam atividade sexual: havia defloramentos rituais, praticados por sacerdotes e prostituição, masculina e feminina, nos templos da Mesopotâmia, da Fenícia, de Chipre, de Corinto, de Cartago, da Sicília, do Egito, da Líbia, da África Ocidental, em Israel e na Índia.

Era indiferente o sexo do parceiro sexual do deus, da deusa, e dos seus adoradores: homem ou mulher, a opção equivalia a uma simples questão de gosto pessoal; o decisivo achava-se, não em com quem se fazia, porém o que se fazia: prestigiava-se o papel ativo, de penetrador; menoscabava-se o de sacana.

De 3.000 antes de Cristo até os primórdios da era cristã, a homossexualidade integrava as culturas do Oriente Próximo, existia fora da repressão e do estigma que lhe surgiram posteriormente: a sua pratica era livre e aberta.

Em Sacara, no Egito, um túmulo continha dois homens, e representações suas, em que  figuram de mãos dadas e abraçados; os seus nomes, combinados sob forma de letreiro na entrada da tumba, resultam no significado “juntos na vida, juntos na morte”, e pertenciam, aparentemente, a uma elevada categoria social.
Na África anterior a 1.400 antes de Cristo, conhecia-se, aparentemente, a homossexualidade; com certeza, praticavam-na os bosquímanos, o grupo étnico mais importante da África Austral, cujas pinturas rupestres representavam-na.

Na Índia, os deuses eram afetiva e sexualmente bissexuais, o que influenciou a população indiana, em igual sentido, até o advento da ocupação britânica, responsável por uma alteração das mentalidades e dos comportamentos, o que resultou, na atualidade, em uma certa renegação da homossexualidade e a sua atribuição à influência do Ocidente.

Na Índia, os casamentos correspondiam a vinculações voltadas a constituir ou a fortalecer laços entre famílias, por meio da geração de filhos, fora do pressuposto (ocidental) da afetividade entre os cônjuges, livres, assim, para amar a terceiros e manter atividade sexual com eles. Os textos hindus mais antigos, designados como literatura védica (cerca de 200 antes de Cristo a 800 depois de Cristo), contém a narrativa relacionada com Crixna, um deus que assume formas humanas, e Ardjuna, simultaneamente divino e humano: tratava-se de amigos que se amavam.

Na China, anteriormente à era cristã,  havia atração sexual e amor romântico dos homens por ambos os sexos. Por norma, os homens casavam-se e procriavam, porém, geralmente, sem conotação afetiva: a exemplo de outras culturas antigas, os membros do casal eram livres para realizar-se afetivamente em outras relações, independentemente do sexo do terceiro.

A literatura chinesa antiga enaltecia as relações homossexuais, como situações de amor romântico, a exemplo de Ling e Mizi.

Nas Américas, a escassez de registros dificulta a observação dos costumes sexuais anteriores à colonização européia.

O judaísmo condenava, de todo, a homossexualidade, e a punia com a morte, pena que previa para outros comportamentos, como praguejar, ser filho rebelde e cometer adultério.

Diferentemente dos deuses dos povos vizinhos de Israel, a sua divindade era alheia à sexualidade, embora exortasse os homens à procriação, único fito aceitável da atividade sexual, pelo que a sua única modalidade admissível correspondia à intromissão do pênis na vagina, visando à gravidez.

Segundo a Bíblia, todo e qualquer ato sexual que não resulte, potencialmente, ao menos, em procriação, é antinatural e condenado por deus, o que tornou os judeus uma exceção, dentre as civilizações antigas, na sua condenação da atividade sexual estéril, o que incluía a homossexualidade.

O Levítico proíbe expressamente, contudo, qualquer relação sexual entre homens, qualifica-a de abominação e prescreve-lhe a morte, à guisa de punição, sobre ambos os envolvidos; o Deuteronômio, por sua vez, proíbe a prostituição sagrada em Israel, masculina e feminina.

No episódio de Sodoma, os naturais daquela cidade tencionavam praticar o coito anal, como ativos, com os seus visitantes, ao que Lot ofereceu-lhes a sua filha. Deus aniquilou Sodoma não em conseqüência dos desejos homossexuais dos seus habitantes, porém devido à inospitalidade com que eles trataram os forasteiros, à sua soberba e à sua negligência face aos pobres e indigentes.

A importância atribuída pelo judaísmo à procriação como função exclusiva da atividade sexual correspondia a uma exceção em meio aos demais povos, nos quais o amor compreendia pessoas de sexo igual ou diferente.

Arthur Virmond de Lacerta Neto

SOBRE O AUTOR

Arthur Virmond de Lacerta Neto

Arthur Virmond de Lacerda Neto é jurista, filósofo, advogado, professor e escritor de sucesso. Nascido em Portugal, ele reside atualmente em Curitiba, e é colunista da Lado A desde 2007.

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