Arquivo

Transexualismo – Parte III

Redação Lado A 17 de Dezembro, 2007 18h23m

COMPARTILHAR



Após um bom tempo, cá estamos novamente para fecharmos a série sobre transexualismo.

Muito já foi explicado sobre este tema, passando um pouco da idéia do que é ser uma transexual.


Agora, falarei sobre como é o dia a dia de uma transexual, como se comporta, como se coloca em relação à sociedade, o que gosta, o que faz e o mais importante: o que quer. Como anteriormente relatado, uma transexual não quer ser nada mais, nada menos, que uma mulher, uma mulher dentro dos padrões de sociedade. Aquela que quer seu espaço no campo de trabalho, aquela que se produz para impressionar, aquela que, acima de tudo, quer ser amada por alguém que realmente a mereça. Mas, como tudo na vida, nem sempre é fácil. Porém, mesmo sabendo destas dificuldades, devemos, ainda, pensar no que leva esta pessoa a assumir uma identidade que pode vir a lhe causar conflitos. A partir desta breve reflexão algo pode ser explicado em relação a crer em uma suposta escolha ou em apenas uma forma diferente de comportamento.


Como seria o dia a dia de uma transexual? O que ela faz? Como é seu dia desde que acorda até a hora que deita? Para isso, devemos analisá-la como uma outra pessoa qualquer, enfim, analisá-la simplesmente em todos os campos, profissional, afetivo, familiar e de relacionamentos. Então, exploremos estes campos.


TRABALHO: O que é muito comum, para uma transexual, é se tornar uma profissional da beleza, isto é, ser cabeleireira, manicure e afins. Algumas, em um número deveras reduzido, conseguem posição de prestígio, como em cargos públicos, professoras, atrizes, cantoras, destacando-se mais na parte artística. São pessoas que se destacam no que fazem, pois sempre buscam fazer o melhor, e assim o fazem, talvez até melhor que muitos considerados “normais”.


Mas, infelizmente, devido ao grande monstro do preconceito que assola estas pessoas, muitas delas não conseguem encontrar seu espaço no mercado de trabalho, pelo medo estúpido de que sejam reconhecidas como transexuais, gerando assim um sentimento de repulsa por parte de clientes, pois na visão não muito inteligente de pessoas preconceituosas, transexuais são pessoas criadas para o sexo e para o prazer e para nada mais. Sendo assim, muitas caem na rua, nas calçadas, vendendo seus corpos, para aqueles mesmos que as criticam e que dizem que são feitas para o prazer.


AMOR: Campo minado. Como já comentado anteriormente, uma transexual quer ser amada e respeitada como toda mulher. Mas um conflito surge então. Uma vez que uma transexual pensa como mulher, age como mulher, vive como mulher, seu parceiro deve ter e terá todas as formas masculinas de atividade sexual, isto é, comportamento heterossexual. Então, um problema surge. Na sociedade em que vivemos, um heterossexual terá relações, e assim se propõe a tal, como mulheres nascidas com órgão sexual feminino, repulsando desta forma o órgão sexual anatômico de uma transexual. Vale lembrar que transexuais são pessoas que têm aversão ao sexo anatômico e não apenas aquelas ou aqueles que se submeteram à cirurgia de correção de gênero.


Mas, felizmente, mesmo com todo o preconceito existente, encontramos vários casos de matrimônios felizes em que os transexuais em questão amam e são amados, respeitam e são respeitados pelos cônjuges. Por outro lado, também há casos de pessoas transexuais que, por motivo de solidão, acabam se entregando a amores falsos, se submetendo a varias situações apenas para manterem as pessoas que amam por perto. Mas também é válido ressaltar que esta situação não é exclusiva de uma transexual, podendo ser também vista em casais heterossexuais e assim por diante.


FAMÍLIA: Campo delicado. Na maioria das vezes, devido a grande expectativa dos pais e restante de familiares, a exclusão de um membro transexual acontece. Muitas vezes pela decepção que a família sente por ter, por assim dizendo, criado uma expectativa e receber um resultado diferente. Não só por esta decepção a repulsa é presente, mas também pelo medo de ver alguém que se ama ser agredido de alguma forma, o que, convenhamos, pode vir a acontecer, mas a repulsa também é uma forma de agressão e, posso afirmar leitores, a maior agressão para uma transexual vem de sua própria família, onde a dor de ser recriminado por aqueles que tanto se ama é bem mais intensa do que ser agredido por alguém a quem não damos muito valor.


Enfim, a questão não é que a vida de uma transexual é difícil, mas sim viver em um mundo que não está totalmente preparado para encarar esta forma de vida, esta forma de ser, esta forma de ver o mundo. As pessoas cobram, sim, e como cobram, de todos nós, mas a pressão, o preconceito e a violência podem ser mais intensos em relação às pessoas marginalizadas, como os transexuais. Talvez, isto facilita a compreensão do porquê muitas preferem omitir o fato de assim serem, ao invés de escancarar isto ao mundo. Não por vergonha de serem o que são, mas talvez para não chamar atenção pelo que são.


Eu, Lou, falo facilmente sobre isto, porque sou uma transexual e já passei por muito de tudo que escrevi aqui, desde o preconceito até a repulsa familiar, mas briguei pelo meu sucesso, pois consegui um espaço bom na sociedade, tenho emprego, tenho muitos amigos, amores, talvez, sempre fui atrás do que queria. Mas e quantas outras lutam apenas por terem um pouco de dignidade?


Espero que com a divulgação desta série, possa ajudar a muitas que estão escondidas, por medo, vergonha, não sei, mas tirá-las, levá-las até a luz e mostrar ao mundo que não somos monstros, não somos máquinas de prazer, somos mulheres, mulheres de coragem, que encaram a sociedade de peito, de pulso firme, para mostrar, mesmo sem necessidade de provar nada a ninguém, que somos capazes de desempenhar nossas funções de cidadãs e de ser humano.
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         

Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

Redação Lado A

A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

COMPARTILHAR


COMENTÁRIOS