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Estado laico

Redação Lado A 25 de Maio, 2008 03h24m

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A parada guei de S. Paulo, de 2008, adotou por mote “A homofobia mata. Por um Estado laico, de fato”. Estado laico ou aconfessional  significa o Estado indiferente  aos cultos quaisquer:  o Estado não adota nenhuma religião, não oficializa nenhuma, não impõe nenhuma, no seu dogma, no seu culto e nas suas práticas. Ou seja, o Estado laico ocupa-se da administração das coisas, e não interfere em questões de consciência, que pertencem à privacidade do indivíduo.

No Brasil, o Estado tornou-se laico em 1890, graças à proclamação da república: enquanto a monarquia adotava oficialmente o catolicismo, como credo obrigatório e discriminava abertamente os acatólicos,  a república desligou-se do catolicismo sem adotar nenhuma religião como credo oficial, ou seja, o Estado passou a ser laico, sendo-lhe proibido (pela constituição)  beneficiar e  prejudicar qualquer confissão religiosa: tornou-se-lhes indiferente e passou a zelar exclusivamente pela administração material do país e não mais também pelo estado da consciência das pessoas. Tratou-se de um avanço no sentido da liberdade de pensamento, que resultou diretamente da influência do  Positivismo.

Positivismo é a doutrina que o francês Augusto Comte (1798-1857) concebeu e cujos princípios fundamentais são estes:

a) o entendimento, em filosofia,  de que o mundo funciona segundo leis naturais que lhe são inerentes, e não segundo a intervenção de seres sobrenaturais (Deus) nem de energias, espíritos ou forças igualmente sobrenaturais,

b) o entendimento, em religião, de que  há um ser supremo, superior a cada um de nós, a Humanidade, conjunto dos seres humanos de todos os tempos,

c) o entendimento, em moral,  de que o altruísmo, vale dizer, a bondade sob todas as suas formas é preferível ao egoísmo sob qualquer das suas expressões,

d) o entendimento, em política, de que o Governo deve limitar-se a atuar sobre as coisas, e jamais sobre os pensamentos, ou seja, deve ocupar-se da administração da vida material de cada coletividade, sem interferir no que se relacione com as convicções das pessoas: não deve o Estado impor  nenhuma religião, tampouco os atos de culto correspondentes; em suma, o Estado deve ser laico, neutro em matéria de religião. O seu lema é “Ordem e Progresso”.

O Positivismo é republicano: sê-lo significa optar por um regime político em que não há rei nem imperador, nem nobreza, nem privilégios decorrentes do nascimento da pessoa em certa família; significa adotar um regime político em que todos os esforços do governo visam ao bem-estar da coletividade, mediante a atividade pacífica, ou seja, extreme de qualquer violência.

Ser positivista equivale, ainda, a preferir-se uma república laica, ou seja, um Estado neutro em matéria de religião, que não oficializa nenhuma, não ensina nenhuma, não proíbe nenhuma, não prestigia nenhuma, não impede  os atos de culto de nenhuma nem os promove, sob forma de feriados oficiais, comemorações públicas, missas encomendadas etc..

De marcante presença em vários países do mundo, inclusivamente no Brasil, em que influenciou o ensino, a literatura e a política, também graças à influência do Positivismo, o Brasil deixou de ser uma monarquia confessional, em que havia uma religião oficial (a católica) e converteu-se em uma república leiga; mercê diretamente desta influência, instaurou-se a separação entre o governo e a religião, com as  conseqüências da liberdade de consciência e  da laicidade do Estado; mercê desta influência, desde 1890 até 1931, os feriados nacionais brasileiros correspondiam a 1º de janeiro (comemoração da fraternidade universal), a 21 de abril, a 3 de maio (dia ao qual, então, se atribuía o descobrimento do Brasil), a 13 de maio (pela fraternidade dos brasileiros), a 14 de julho (em comemoração da República, da Liberdade e do povos americanos), a 7 de setembro, a 12 de outubro (descobrimento da América), a 2 de novembro (dia dos mortos) e a 15 de novembro.

Cuidavam-se de datas cívicas, históricas, de fraternidade, e uma de natureza moral,  sem nenhuma de conotação religiosa: respeitava-se a neutralidade religiosa do Estado e celebravam-se efemérides da história pátria ou mundial, e  uma da vida social que, direta ou indiretamente, todos os brasileiros achavam-se capazes de celebrar, fora de qualquer favoritismo religioso.

Há, por outro lado, favoritismo religioso em relação ao catolicismo na adoção, como feriados nacionais, das datas do Natal, da Páscoa e do Corpo de Deus. Eles devem ser eliminados, o que até hoje não aconteceu, muito menos por devoção da suposta maioria católica dos brasileiros, do que pelo apego à folga que eles propiciam nos dias de trabalho.

Para o Positivismo, a laicidade do Estado encarna um princípio cardeal que deve reger os governos, pelo qual se assegura a liberdade de consciência, que caracteriza o regime republicano. República, no Positivismo, equivale a Estado laico.

Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

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A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

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