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ELEIÇÕES 2008 – Tiago Silva: candidato a vereador em Floripa

Redação Lado A 21 de Agosto, 2008 00h59m

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ELEIÇÕES 2008
Na região Sul, seis candidatos a vereador são homossexuais assumidos. A Lado A publicará entrevistas com um representante de cada estado, semanalmente.

Tiago Silva disputa as eleições para vereador em Florianópolis, Santa Catarina. O funcionário público municipal, que fará 26 anos no dia 11 de setembro, quer o cargo na câmara municipal e continuar a apoiar a comunidade em sua cidade.


ENTREVISTA
Quais as suas propostas?
Tiago Silva – As propostas para minha candidatura nascem no campo da ética e da luta pela conquista dos direitos humanos e pelo respeito integral a eles, iniciando especialmente pela defesa dos direitos das minorias sexuais, da inclusão social e econômica dos negros, e também das mulheres, terceira idade, crianças e jovens, meio-ambiente, educação, cultura etc.

Entendo que o papel do vereador é o de representar e defender os interesses coletivos, da sociedade como um todo, mas percebo que em relação às minorias sexuais, por exemplo, de modo geral a classe política deixa quase tudo a desejar na defesa dos direitos fundamentais da pessoa humana. Um ponto forte e de prioridade de minha luta na Câmara será a defesa dessas minorias, dando voz e meu voto por ações que defendam seus direitos, na sua totalidade.


Por que se candidatou?
Tiago Silva – Eu me candidatei pelo incentivo recebido de tantos amigos e amigas que chegavam para me pedir isso, uma vez que pelo meu trabalho nos últimos anos tive muitas experiências que me colocavam em contato com a realidade das dificuldades sofridas por tanta gente. Aos poucos fui percebendo que junto com essas pessoas poderíamos lutar com mais força, com maior mobilização, para conseguir o respeito e a dignidade que temos fundamentalmente como pessoas humanas.


Quando surgiu a idéia se ser político?
Tiago Silva – Como te disse, fui percebendo que muitas pessoas me incentivaram a tomar uma decisão de fazer parte dessa luta partidária. A participação política, entendida como nossas relações no meio da sociedade em que vivemos, é um dever de todos nós. Não seríamos cidadãos nem cidadãs se, no mínimo, não nos indignássemos com tantas atrocidades que acontecem todo dia na vida de todo mundo.

Eu passei a acreditar mais profundamente que o papel do “político”, daquele que atua através dos partidos políticos, é o de captar a voz e os anseios de seu povo, e lutar com ele para a melhoria da qualidade de vida. Mas de jeito nenhum que eu acredito naqueles políticos à moda antiga, mas que ainda atuam por aí, que têm uma postura assistencialista e fazem de seus cargos públicos um balcão de atendimento de interesses que contrariem os direitos das minorias. Minorias que na verdade, são a maioria: lésbicas, homossexuais, negros, crianças, mulheres, terceira idade…


Por que não há homossexuais assumidos em cargos eletivos?
Tiago Silva – Eu acredito que a maioria das pessoas não tem idéia muito clara do que seja a homossexualidade, e isso faz parte do processo de compreendermos nossa identidade e nossa cidadania. Há muito “preconceito” e falta de “conceito” mesmo entre os homossexuais. As pessoas falam de  “opção sexual” e de “homossexualismo”, por exemplo, que são termos mal entendidos, e que não são o que é na verdade a questão da ‘homossexualidade”.

Esses mal entendidos ainda são causa de vergonha, de medo do preconceito, do que a comadre da vizinha da colega de trabalho de cada homossexual vai pensar de alguém que se diz assumido. É um grande problema criado pela falta de informação que gera tanto preconceito e violência de todas as formas: comentários maldosos, conversas fiadas, brincadeiras de mau gosto e tantas atitudes que fazem diminuir a “humanidade” do outro por causa da orientação sexual das pessoas.

Assim, acredito que é muito positivo que as pessoas se assumam na sua orientação sexual e tenham orgulho de si mesmas, tenham uma boa auto-estima, porque o respeito que damos aos outros ninguém pode nos tirar.

Essa falta de representantes homossexuais assumidos nos poderes públicos pode ser por causa desse medo, dessa vergonha.


O que faz para atrair eleitores?
Tiago Silva – Nossas propostas são muito claras a respeito do que acreditamos ser a luta pela ética em toda a nossa vida, e pelos direitos humanos como sendo o de todas as pessoas. Claro que posso considerar que tenho uma mensagem especial para os eleitores que são homossexuais (LGBT): nós devemos nos unir, politicamente, para lutar e conquistar nossos direitos, porque os poderes públicos, até agora, se fazem de cegos para a realidade de nossa dignidade humana estar sendo desrespeitada.

Eu e aqueles que estão comigo acreditamos que estamos construindo um momento importante na história da vida política de Florianópolis e Santa Catarina, levantando uma discussão que muitos tinham medo, ou vergonha, de levar adiante. Se neste momento de eleição os eleitores se identificam e se sentem atraídos pela nossa mensagem de união para a luta, já nos sentimos muito satisfeitos.  Mas queremos participar dessa eleição para ganhar, para ir mais além e com a participação de todos para aquela construção de uma cidade feita por todos, mas com todos os direitos e deveres para todos.

É triste perceber que, por exemplo, os homossexuais são cidadãos e cidadãs que estudam, trabalham, vivem na sociedade e pagam seus impostos como qualquer um, mas têm todos os dias seus direitos desrespeitados e, pior ainda, negados por uma faixa da classe política nos níveis municipal, estadual e nacional.


Já sentiu preconceito por parte dos cidadãos?
Tiago Silva – Claro que sim, se entendi sua pergunta como se eu tivesse sofrido algum tipo de discriminação por lançar minha candidatura sendo homossexual assumido. Isso acontece com todo mundo, como se fosse natural a gente sofrer discriminação por sermos homossexuais. Não, não é natural. Isso é preconceito, sim, é ignorância no sentido de falta de compreensão do que é cidadania, do que é ser cidadão ou cidadã com direitos que ninguém pode desrespeitar. Na sociedade atual isso não deve ser tolerado de forma nenhuma. Por isso é preciso lutar para ter ali, no papel oficial, a lei que garanta e que faça serem respeitados os direitos dos homossexuais.

Em Florianópolis, desde 1994, a Lei Orgânica Municipal tem escrito lá no seu Artigo 5º. inciso IV “a igualdade absoluta entre os cidadãos, coibindo a discriminação por motivo de origem, raça, cor, sexo, idade, estado civil, crença religiosa, orientação sexual, convicção política e filosofia ou outras quaisquer formas”. Ora, parece que apenas as pessoas a que se referem as palavras “orientação sexual” são desrespeitadas, e ainda parece que seria “normal” desrespeitar os direitos dessas pessoas. Absolutamente não é, e agora precisamos de uma lei que torne crime esses desrespeitos. Algo tipo assim, como no teste do bafômetro quando a pessoa que dirige no trânsito embriagada desrespeita a lei: paga multa, tem a carteira apreendida, vai ser penalizada com medidas alternativas e prestação de serviços etc.

Imagine se quem desrespeitasse as minorias sexuais, se autuado em flagrante ou não, tivesse de pagar multa, de ter seu estabelecimento fechado por um período, de ser penalizado em trabalho alternativo, ou mesmo ser preso? O que dói no bolso, e no orgulho, faz aprender uma lição: a lição de cidadania, de que somos responsáveis por nossos atos, e temos direitos e deveres a serem respeitados por todos.


Como é sua relação com o partido político que escolheu?
Tiago Silva – O partido por onde lanço minha candidatura, o PPS – Partido Popular Socialista – tem um imenso histórico de lutas pelos direitos humanos, desde sua criação. No Manifesto do PPS, lançado em 1992, há uma declaração de princípios para a construção de uma nova ética e um novo tipo de ação política para a construção de um mundo melhor para todos.

Eu me identifico plenamente com os ideais do Partido e seus núcleos e movimentos em defesa da pessoa humana, em especial com seu Movimento GLBTS que defende a consciência cidadã, a fraternidade e a solidariedade. É um Partido que explicita claramente, com todas as letras, seus princípios de luta e defesa das esperanças da humanidade.


Já houve algum tipo de preconceito por parte do Partido?
Tiago Silva – Que eu saiba, não. Se houvesse no Partido quem desrespeitasse os princípios pelos quais ele se formou nessas dezenas de anos, eu acredito que isso seria caracterizado como transgressão às normas partidárias e um caso a ser analisado pelo seu Comitê de Ética. Milhares de pessoas já morreram, durante os anos negros de perseguição política em nosso país, pelas causas defendidas pelo Partido. Se houvesse um gesto sequer de preconceito isso seria como negar aquele Manifesto tão belo a que me referi.


Acha que gay vota em gay?
Tiago Silva – Vota sim, como também há infelizmente os gays que votam naqueles vereadores “balconistas de favores” que vendem a peso de ouro o poder que seu cargo lhe confere, fazendo a corrupção e provocando o descaso pelos benefícios e a luta para estendê-los ao povo.

A falta de consciência cidadã, seja ela de gays ou heterossexuais, acaba por alimentar um círculo vicioso que traz mazelas e sofrimento para o povo que é esquecido, e manipulado, pela classe política aproveitadora dessa ignorância.

Estamos numa hora de profundas mudanças sociais, e todos aqueles que sofrem por esse descaso da classe política devem estar atentos para as falsas promessas. Estamos na hora de votar conscientemente, e mais ainda de também lutar conscientemente pelos nossos direitos humanos, de unir forças para combater tudo o que desrespeite nossa dignidade homossexual e humana. Lutamos por defender essa dignidade, e por isso nosso lema é “para fazer a diferença”, ou seja, para também fazer um mundo diferente, de justiça social, e, onde sejam respeitadas as diferenças quando todos têm seus direitos e deveres iguais.

Assim, acredito que é importante que a comunidade LGBT saiba de nossas propostas e, se houver identificação com nossa luta, o voto dos gays para irmos defender nossos direitos será muito bem-vindo. Será um voto consciente que fará a diferença na Câmara Municipal.

Mais informações sobre Tiago Silva no site: www.tiagosilva23123.can.br

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SOBRE O AUTOR

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A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

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