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Resumão: Temporada brasileira de inverno 2009

Redação Lado A 29 de Janeiro, 2009 11h16m

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Depois de 79 desfiles entre o SPFW e o Fashion Rio, o calendário oficial da moda brasileira mostra suas apostas para uma estação marcada pelo cenário econômico de crise, que começou, no ano passado, com a quebra de bancos norte-americanos. Traduzindo para um bom português: uma temporada sem grandes inovações e arroubos criativos, bem focada no comercial. O que marcou a visão das marcas para o inverno brasileiro desde ano, talvez, seja a ausência de tendências e a amplitude de ofertas e estilos – mais do que a roupa, o que vale aqui é a personalidade de quem usa, confirmando a importância da informação de moda nas escolhas que essa liberdade toda proporciona. Abaixo, um resumo dos desfiles do Fashion Rio e da SPFW, destacando a moda masculina.

FASHION RIO
Ausländer
Hype entre a juventude carioca e vendida fora do país em lojas como Galleries Lafayete e Collete, em Paris, e El Corte Ingles, em Madri, a Ausländer se inspira no global cool – disseminação rápida das tendências de moda e comportamento jovem através da internet – para dar o viés de seu inverno. O clima de Lower East Side, bairro nova-iorquino boêmio e berço daquilo de mais novo e bacana acontece, fica evidente nos copos térmicos de café, nos óculos geek e nas câmeras no pescoço dos modelos.  Nessa coleção absolutamente desejável – e, arrisco, a melhor da temporada –, a cartela de cores básica, variando entre o preto, branco e vermelho com toques de cinza e vinho, aparece ao lado de brasões aristocráticos e estampas gráficas em peças de modelagem ajustada e que favorecem o corpo. O moletom de capuz, em xadrez pied-de-poule com efeito ótico, a jaqueta motard/militar em couro preto com interior branco e a bomber em xadrez vermelho são os highlights definitivos do inverno, bem como as camisas brancas com debrum em preto.

Complexo B
Crescendo cada vez mais no segmento do streewear, a Complexo B traz a ginga dos malandros cariocas da Lapa para o encerramento do Fashion Rio com sua moda masculina de apelo jovem e descontraído, mas bacana como sempre. Nesse clima de boemia, os xadrezes coloridos e as modelagens amplas encontram os acessórios do momento como as boinas e os lenços amarrados no pescoço, lisos ou xadrezes. Aparecem também o tie dye e o dip dye, técnicas de tingimento de influência hippie – a primeira com o tecido amarrado e a segunda com o tecido mergulhado na tinta – como no inverno passado da Prada.  Os bons coletes, mais tradicionais, têm um contraponto nas modernas peças com estampas gráficas maiores, como as camisetas e os moletons de capuz. O tracksuit de veludinho – lembrando Juicy Couture – funciona bem nas ruas, inclusive separadamente.

TNG
Abrindo a apresentação da TNG, o global Cauã Reymond dava a nota do que seria o visto: roupa comercial, uma espécie de fast fashion numa edição um tanto confusa mas com apelo de massa.  O jeans funciona bem nas modelagens mais ajustadas no corpo, como no cinza clarinho usado com tênis de cano alto e nas boas variações de azul forte, mais color, no início. Os grafismos nas malhas fininhas, perfeitas para a meia-estação, mostram uma vontade de moda mais forte e são peças bastante desejáveis, além da jaqueta bomber em couro marrom. Não precisava: a presença do ator em si, as lavagens muito manchadas (e perigosas) nos jeans, a amarração estranha dos cachecóis.

SPFW
2nd Floor
Entre nuvens e fumaça, aviadores invadiram a passarela sob direção criativa de Adriana Bozon, que apresentou uma coleção pronta para as ruas e de forte perfume retrô, basicamente em tons fechados como marrom, cinza chumbo, vinho, preto e muito dark jeans, reforçando a identidade da 2nd Floor, nascida dentro da Ellus.  Além dos listrados, sempre presentes no vocabulário da marca, as estampas de aviõezinhos surgem como uma alternativa bastante interessante ao floral liberty (aquele de flores bem miúdas sob fundo escuro) que promete ser uma das tendências para este ano. Destaque para a modelagem mais ampla das calças, com o cavalo mais baixo e solto, usadas com bons cintos mais finos e botas pesadas.  A jaqueta bomber – com punhos e cós em malha – também se faz presente ao lado de bons momentos de alfaiataria, como no trench coat usado com mochila de couro (outra tendência forte para 2009).

Alexandre Herchcovitch
Partindo de um tema navy, Herchcovitch se dá melhor justamente quando sai do óbvio e dispara seus marinheiros em mares nunca antes navegados: depois de um bloco um tanto quanto estranho de looks pontuados pelo vermelho-tomate e um macacão impossível de usar, as jaquetas bomber no xadrez da hora, aqui em tratamento vinilizado e com capuz, entram definitivamente para o hit list da estação. As boas toucas de tricot pesado e os casacos de ares militares com abotoamento duplo renovado, mais curtos e ajustados ao corpo, em nuances de cinza mescla, preto e azul marinho são boas apostas para quem pretende se manter aquecido durante o inverno, assim como a ótima jaqueta de nylon em metalassê.

Cavalera
A terceira coleção da marca com Marcelo Sommer no comando presta uma homenagem à Festa do Boi em Parintins. A referência regional serve mais para dividir o desfile em dois blocos – representando Caprichoso e Garantido, os dois bois-bumbá, cada qual com seu azul e seu vermelho – e acaba ficando perdida em meio à forte identidade punk-rocker da marca. O look total em jeans é ótimo e vem direto do que rola nas ruas, bem como a presença do xadrez (tanto o tartan escocês quanto o xadrez búfalo) em boas camisas e até mesmo na linda jaqueta motard azul em lã e no trech coat vermelho. Os cintos de influência country funcionam bem e atualizam qualquer produção de camiseta e jeans na vida real, enquanto as calças, mais skinny e com cavalo levemente baixo prometem deslanchar nas prateleiras.

Colcci
Depois de duas temporadas de peças estranhas e de um gosto um tanto quanto duvidoso, a marca de jeanswear catarinense retoma o foco e limpa radicalmente sua imagem, numa coleção bem executada e que supre todos os desejos dessa temporada, numa cartela restrita de branco, cinzas e pretos. Livre de um tema específico, uma parada do essencial do inverno 2009: os (bons) xadrezes, o (fundamental) skinny branco, os jeans (brutos, detonados ou resinados), a jaqueta de metalassê (em nylon e em couro. A única lembrança da péssima fase de jeans de lavagens múltiplas e rebites fora de lugar se dá com os longos casacos em nylon, de corte esquisito e totalmente dispensável. Uma coleção coerente, comercial e sexy, em plena sintonia com as vontades de agora, que deve fazer parte dos closets mais espertos.

Triton
A coleção de Karen Fuke, batizada de Royal Mania, propõe peças inspiradas na monarquia inglesa com atitude rocker. Os blazers militarizados, como o ótimo em veludo alemão preto, têm pegada jovem e funcionam muito bem nas ruas, como a camisa de gola e punhos brancos, os foulards no pescoço e os tricots regimentais, perfeitamente alinhados com as tendências internacionais. Esse diálogo pode ser percebido especialmente nas camisetas com estampas de quadros clássicos – com direito a molduras douradas e tudo – que também aparecem no inverno da italiana D&G. As calças, ajustadas ao corpo e com cavalo baixo, os coletes e os xadrezes que proliferam aqui e ali, são outros hot tickets que prometem fazer a cabeça dos consumidores antenados da marca.

Ellus
Se focando naquilo que faz de melhor – o jeans – a Ellus mostra um inverno pesado, sujo, bruto, evocando as origens do índigo enquanto vestuário dos trabalhadores braçais das minas e subúrbios. As lavagens variam do cinza clarinho, que se confirma como uma das tendências da temporada, passando pelo cinza-sujo, quase preto, pelo dark blue e pelo preto em si, em modelagem mais dura e oversized. O onipresente xadrez aqui vem sob uma estampa que imita carvão nas camisas, fugindo um pouco do óbvio e se encaixando inteligentemente no conceito linear da coleção. Ponto positivo para as sempre boas botas da Ellus e para as jaquetas, em especial a motard em couro.

Mario Queiroz
Entre bizarros acessórios medievais – pense em Highlander e Coração Valente – e peças que não encontrarão seu caminho nas prateleiras, o inverno de Mario Queiroz tem seus melhores momentos quando encontra o básico. Assim, coletes de alfaiataria, a malharia honesta e sem maiores pretensões e moletons de capuz estampados são as estrelas da fraca coleção que tem em sua paleta de cores cinzas, vinhos, marrons e pretos.O sopro de frescor vem na jaqueta estruturada, em jacquard cinza, nas boas calças de alfaiataria com gancho baixo e nos tênis cirados em parceria com a Puma, em couro com detalhes em lã.

Osklen
Encarando a responsabilidade de transformar em objeto de desejo o batido moletom cinza, Oskar Metsavaht mostra uma coleção um pouco intelectualizada demais e um tanto quanto pretenciosa, que lembrava Prada em um dia ruim. O styling, calcado nos dreadlocks nos cabelos do casting de modelos e nos óculos de grau envoltos em lã, acabou prejudicando as boas peças como a calça em corte alfaiataria e o blazer ajustado, ambos em moletom mescla. Difícil ver o consumidor que vai atrás das camisetinhas E-brigade nas lojas vestindo nas ruas o restante do desfile, como a malha com detalhes bordados em preto brilhante ou a calça em nylon fininho, quase transparente.

V. Rom
Liderada por Igor de Barros, a V. Rom é uma das grandes forças-motoras da moda masculina no país, e traz neste inverno uma bela coleção infelizmente prejudicada pelo styling confuso do desfile. Peças como as camisas xadrez coloridas e os coletes frente-única em tecidos tradicionais de alfaiataria devem fazer a cabeça dos early-adopters.  Outras, como o segmento metalizado, em dourado e preto, apresentado no final, têm grande dificuldade de encarar as ruas, mas têm o mérito de quebrar tabus – ainda que somente nas passarelas. O jeans branco está presente, assim como os moletons com capuz e os brasões, emparelhados com os ótimos tênis e botas de cano alto desenvolvidos em parceria com a Rainha. A exemplo da italiana Dsquared, mostra também jaquetas em couro caramelo com peças em jeans neutro, território perigoso e que pode ter resultados catastróficos nas ruas (impossível tirar da cabeça imagens como os sapatos e cintos caramelo do começo da década), mas que com o devido cuidado podem fazer bonito na vida real.

Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

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A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

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