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Igrejas ditas cristãs se unem e se posicionam contra homossexuais e candidatos aderem

Redação Lado A 15 de Setembro, 2010 21h10m

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Vergonhosamente, ou finalmente mostraram a verdadeira face, igrejas brasileiras estão se posicionando contra o Projeto de Lei 122 que pretende criar a proibição da discriminação contra homossexuais no território nacional. O projeto que prevê multa e cassação de alvará a estabelecimentos onde sejam cometidos crimes de preconceito contra homossexuais, ou processos administrativos quando observado em esfera pública, está tirando o sono de muitos religiosos pelo que parece. Em um momento jamais visto na história do país, evangélicos e católicos se unem para combater o que chamam de lei da mordaça e abertamente indicam votos aos seus fiéis, intrometendo na política do país. E há aqueles políticos que caem na armadilha, por medo de entrarem para a lista negra das igrejas. Este momento insano e com ares medievais tem apenas um nome: homofobia.


No culto da 1a. Igreja Batista de Curitiba, o Pastor Paschoal Piragine Jr, com 30 anos de vida religiosa, adverte: eu nunca fiz isso na minha vida (pedir para não votarem em alguém). Ele fala sobre o comunicado da CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, que pediu aos fiéis com todas as letras: Não votem na candidata Dilma Roussef (a declaração foi postada no site da entidade e foi retirada após Dilma se comprometer e deixar claro que não iria interferir em prol dos direitos gays e a favor do aborto, assim como fez Lula). Ele passa um vídeo que começa falando dos homossexuais, união civil gay, criminalização da homofobia entre outros temas polêmicos prestigiados no Programa de Direitos Humanos do Governo Federal, o PNDH 3. O pastor então usa a Bíblia para fazer terrorismo: Está lá, Deus vai julgar esta terra se aderirmos à iniqüidade (o pecado como normalidade). O mesmo discurso é proferido por diversos homens das mais diferentes igrejas brasileiras, em todos os cantos do país.


Com consequência, vemos candidatos importantes se manifestarem sobre o assunto. A candidata a senadora Gleisi Hoffman, do PT paranaense, lançou uma “Carta aos Cristãos” onde afirma: “A orientação sexual não pode gerar em nós intolerância e ódio. Deus nos dá o livre arbítrio e devemos ser respeitados. Assim como não é certo o preconceito em relação ao homossexual, também não é certo a criminalização de um padre ou pastor que, por convicção ou crença, se coloca contra a prática do homossexualismo”.


Em uma sabatina promovida com os candidatos a governadores, o ex-prefeito de Curitiba Beto Richa chegou a afirmar que é contra a adoção de crianças por homossexuais, pois estas causariam prejuízo às crianças. “Sou contra, porque comprovadamente, cientificamente, isso causa um abalo, um transtorno psicológico, mental para as crianças. O Brasil ainda não tem essa cultura, embora eu seja a favor da união civil”, afirmou o candidato em sabatina do site UOL. Antes, se posicionou contra o aborto por ser “cristão e a favor da vida”. Um dia antes, o outro candidato líder nas pesquisa ao governo do Paraná, Osmar Dias, afirmou que era contra a adoção e que o país já reconhece a união estável de homossexuais, que não precisava casar, afirmou arrancando gargalhadas da platéia.


Note a semelhança do discurso prolixo: Gleisi diz que não tem preconceito, Richa afirma que é a favor da união civil (que se distingue de casamento) mas se posicionam exatamente como a CNBB mandou, assim como Osmar. Ora, está claro que os dois ignoraram qualquer noção de democracia ou direito humano para pender aos cristãos e buscar votos. Lembrando que agora a bancada evangélica e a católica-protestante se juntam, bem como os votos.


Tomando como referência os três posicionamentos, gostaria muito de entender como eles julgariam o caso da viúva iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, de 43 anos, condenada a morte em seu país por adultério. Claramente, a lei de lá, baseada em uma escritura religiosa para eles, o Corão, diz que ela é pecadora e criminosa. Mas, segundo a candidata paranaense, não é certo um religioso agir contra a sua crença. Por eles, a condenação de Sakineh apontaria duas saídas: a religião não pode pautar a lei e a lei precisa respeitar a liberdade religiosa. A primeira é obviamente o caminho a ser tomado por uma democracia. Claro que são cristãos e não matariam a mulher.


Mas e os homossexuais mortos e aqueles que se matam por causa do preconceito contra os homossexuais no Brasil? A cada 1,5 dia, um homossexual é assassinado no país em razão da sua orientação sexual, apenas segundo dados de registros da imprensa. Outros tantos se matam por causa de discursos religiosos preconceituosos, por sofrerem preconceito em casa, na escola, ou por ouvirem que ser homossexual é pecado. Onde estão os cristãos agora? São os mesmos que buscam combater uma lei que visa diminuir o preconceito, a violência, a morte e que pode dar dignidade, qualidade de VIDA aos homossexuais brasileiros.
 
Engraçado que os mesmos argumentos são utilizados pelos fundamentalistas islâmicos: respeito pelas escrituras sagradas e respeito às famílias. Como podemos ver, não precisamos ir até a Idade Média para ver a situação atual. Direito Humano é promover a igualdade, sem distinção. Se não podemos pegar discursos bíblicos para aferir à mulher, judeus e às outras raças o tratamento que estas escrituras dizem que devem ser postos em prática, por que usar o homossexual como bode expiatório da hipocrisia religiosa?


A lei 122 é um projeto que visa diminuir o preconceito, em graduar o preconceito contra homossexuais tão grave quanto o contra mulheres, negros, deficientes, idosos, entre outros. Tanto que a lei prestigia em sua última versão a todos estes segmentos. Não entendo o quão difícil é para alguns heterossexuais aceitarem essa igualdade que em nada diminui seus direitos. Há os que dizem que a homossexualidade vai aumentar, que isso macula o seio sagrado da família. Ora, parece que a questão aqui é outra, pois nunca vi heterossexual convicto agir com tal insegurança.

Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

Redação Lado A

A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

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