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Como a gente reage quando leva um fora

Bruno Uerba 10 de Setembro, 2014 20h57m

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Seja um fora ou um pé na bunda, como lidamos com a rejeição?
Fui ao Teatro Municipal do Rio de Janeiro assistir à tão comentada Ópera Salomé, realmente digna de aplausos, com direito a muitos assovios seguidos de “bravo”. Mas não vou me estender muito pra não ficar chato e vou resumir a história da forma mais coloquial possível pra irmos direto ao ponto.

Reza a lenda que Salomé era bem rodada e já tinha se deitado com homens de todos os tipos. Até aí tudo bem, quem não tem um “amiguinho” galinha que passa o rodo em geral e se acha o rei da cocada preta?  Sem nomes, por favor.

O fato é que Salomé conheceu o profeta João Batista, um homem puro que, previsivelmente, a rejeitou. A dançarina, que tinha o poder da sedução à flor da pele, ficou tremendamente desnorteada: ‘Como assim, alguém não se entrega aos meus encantos?’.

E então, ela tentou, tentou, tentou de novo e pah! Levou um baita pé na bunda. Não convivendo bem com a dor da rejeição, ela dançou para o rei, que se entregou aos seus jogos e se comprometeu a dar qualquer recompensa que ela quisesse, e sabem o que ela pediu? Quem se arrisca?

Dou-lhe uma, dou-lhe duas…

 Pasmem! Ela pediu a cabeça de João Batista. Esse desfecho é o mesmo contado na história judaico-cristã – está na Bíblia.
O que mais me intrigou no espetáculo foi quando, ao final, ela se despencou no chão de arrependimento por um amor doentio que não foi correspondido e citou as últimas palavras:
“- O mistério do amor é maior que o mistério da morte”.
Será mesmo?
Todos os dias pessoas levam um NÃO, se desabam, morrem e voltam a viver, silenciosamente. Sentem-se como um lixo, marginalizadas pelo que chamam de amor. E carregam consigo uma amostra grátis da sensação de abandono. Quem não perde o chão quando valoriza muito algo ou alguém que acaba fugindo de nós? Vez por outra a gente se pega chorando e nem sempre caem lágrimas. Ficamos com o coração estraçalhado sem que ninguém perceba, mas seguimos com nossas vidas esperando que o tempo possa nos curar. Eu mesmo já passei por isso, e não foi na adolescência.
Não precisa bancar o valentão, nesse momento somos eu e você. Faça um mini flashback na sua vida e tente buscar na sua memória um momento em que você amou alguém que nunca soube da sua existência, ou, talvez, que você tenha se deitado por uma, ou duas vezes, e passou uma eternidade esperando que o telefone tocasse, convivendo diariamente com a dúvida, com a angústia que nos leva em direção ao abismo. E tem também, a pior de todas no meu entender, você viveu um romance de filme, se entregou de corpo e alma e, num estalar de dedos, se viu fazendo as malas para partir porque alguém decidiu que não te amava mais.  E o que fazemos quando isso acontece, o que somos capazes de fazer por falta de amor?
Não há nada de novo debaixo do sol quando o assunto é rejeição. Somos todos crianças imaturas que não sabem lidar com uma resposta negativa.  Eu poderia passar uma tarde compartilhando casos de pessoas que ouviram um NÃO e deixaram essa frustração contaminar suas vidas; disseminando o mal; fazendo fofoca da vida alheia (Twitter pra quê, não é mesmo?) ou, então, terminaram o relacionamento de anos desejando que a pessoa com quem dividiram a maior intimidade se ferrasse – que doideira. Isso sim é pedir a cabeça numa bandeja, isso é inferno.
O mundo está infestado de Salomés, de gente que vive preocupada com seu próprio prazer, que se acha irresistível, digna de capa de revista, com milhões de seguidores nas redes sociais e não acredita, sequer, nas voltas que a vida dá. E quando dão com a cara na porta de alguém, querem se vingar, fazer joguinhos, sair falando mal a torto e a direito pra justificar um problema mal resolvido com a própria autoestima. Briga de egos, ou, mimimi mesmo, pura infantilidade.
É preciso aprender a interpretar os sinais pra não surtar e tornar-se numa pessoa amarga que sai por aí desacreditada num recomeço, se blindando e vivendo de farsas do tipo: eu sou o sorriso que posto no meu Facebook, enquanto por dentro está um caos. Levar um pé na bunda dói sim, não há como negar, mas paciência. O ideal é conviver com isso, dar risadas de si mesmo e jamais adicionar esse sentimento na sua lista de favoritos da alma. A vida é muito curta pra ficar ouvindo o mesmo disco, carregando um peso nos ombros de coisas que não são pra gente.  Levou um fora?
Pule pra outra. E aprenda a compreender porque em algum momento será a sua vez de ser testado diante de alguém que estará do outro lado do balcão, lhe desejando como uma hiena faminta e despertando em você, zero interesse.  Falta empatia por toda parte, já presenciei pessoas em boate sendo enxotadas com um “Sai pra lá viado pobre” ou “rala sua mandada” bem no estilo Valesca Popozuda, podem rir, mas vamos combinar, é pesado. Quando fazem com a gente a história muda de figura. O pau come.

De todos os foras e pés na bunda que já levei, aprendi que não dá pra sair por aí desperdiçando lágrimas com pessoas que não tem nada a ver com a gente. Precisamos encontrar alguém que enxergue a vida da mesma forma que nós. Em contrapartida, não dá pra usar as pessoas como step, ou meros peguetes sem esclarecer de fato as reais intenções. Nunca sabemos o que se passa na cabeça das pessoas. Então, pegação é pegação, namoro é namoro, casamento é casamento. Se a pessoa não entender, vale a pena desenhar. Seja lá qual for o seu grau de contato, brincar com o sentimento alheio é correr o risco de pedirem o seu coração – numa bandeja.

 

Bruno de Abreu Rangel
brunorangelbrazil@hotmail.com

 

Bruno Uerba

SOBRE O AUTOR

Bruno Uerba

Bruno de Abreu Rangel é um celebrado escritor carioca e tem três livros publicados. Atualmente ele reside nos EUA e é colunista da Lado A desde 2014.

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