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A importância da compreensão das homofobias

Redação Lado A 04 de Fevereiro, 2015 01h21m

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A expressão “homofobia mata” tem sido veiculada nos últimos anos na mídia brasileira para indicar uma triste realidade: o número de membros da comunidade LGBT, especialmente homossexuais, transexuais e travestis, mortos por crimes de ódio, aversão e intolerância a orientações sexuais e identidades de gênero não heterossexuais tem aumentado. Apesar da expressão “homofobia mata” não ser a mais adequada para designar os atos de rejeição e intolerância a todos os tipos de orientações sexuais não heterossexuais, uma vez que hoje já existem expressões específicas para alguns grupos, tais como lesbofobia (para as lésbicas) e transfobia (para transexuais e travestis), ela tem funcionado como um guarda-chuva onde cabem todos os tipos de aversão a orientações sexuais e identidades de gênero não heterossexuais. No caso da homofobia que é a aversão, rejeição e/ou ódio às orientações sexuais homossexuais, devido a importância do seu estudo hoje e pela gravidade das consequências negativas que ela traz aos homossexuais e suas famílias, já sabemos que não cabe mais falar em homofobia no singular, uma vez que não existe um único tipo de homofobia e sim homofobias no plural. Ou seja, existem vários tipos de homofobia e vários níveis de homofobia em nossa sociedade.

Reconhecer e buscar compreender a complexidade das homofobias hoje em nossa sociedade brasileira é fundamental para que as pessoas vítimas de homofobia denunciem adequadamente os atos homofóbicos sofridos, busquem os seus direitos junto às instâncias legais e não se deixem abater pela pressão para a conformidade que alguns heterossexuais e homossexuais exercem sobre elas para que deixem as coisas como estão, uma vez que não valeria a pena o desgaste de energia na busca de afirmação de direitos em nosso sistema judiciário. Outro importante objetivo da compreensão aprofundada da homofobia reside em auxiliar os profissionais da Psicologia, Psiquiatria, Psicanálise e demais áreas de apoio sobre as idiossincrasias que perpassam o tema, pois são esses profissionais que normalmente recebem e prestam auxílio às vítimas de homofobia. A homofobia é plural, ou seja, ela se manifesta de diferentes formas e intensidades, assim como é percebida por suas vítimas de diferentes formas e em diferentes momentos.

Compreender essas diferenças é fundamental para que as vítimas de homofobia tenham mais chance de denunciar e obter vitória em ações judiciais que visam caracterizar atos homofóbicos. A homofobia é antes de tudo um fenômeno social, isto é, infelizmente a maior parte das sociedades, em maior ou menor grau, ainda é bastante homofóbica, manifestando aversão às orientações e comportamentos homossexuais. Da homofobia social decorrem todas as demais: a homofobia familiar, a institucional e a internalizada; a homofobia no trabalho e a homofobia na escola ou na universidade; a homofobia explícita e a silenciosa; a homofobia que se caracteriza em um único ato e a homofobia que se caracteriza em uma sucessão de atos ao longo do tempo. A homofobia familiar, como seu nome deixa prever é aquela manifestada pela família, de forma explícita ou silenciosa, ao membro homossexual.

Já a institucional é a homofobia que decorre das regras e normas formais ou informais sociais ou de trabalho ou dos hábitos, práticas e costumes e que criam uma cultura homofóbica de vida ou de trabalho. A internalizada é a homofobia dos homossexuais, interna, muitas vezes inconsciente, negada ou rejeitada, mas sempre presente, uma vez que é quase impossível para um indivíduo homossexual não acabar introjetando algum grau de aversão a sua própria orientação sexual. A homofobia internalizada ou introjetada, não exclusiva dos homossexuais, uma vez que está presente em toda pessoa homofóbica que não percebe ou reconhece o fato, é um aspecto central da psicoterapia afirmativa, uma vez que é fundamental que o paciente homossexual a perceba, reconheça e se liberte dela para poder construir uma identidade de gênero positiva na sociedade.

A homofobia no trabalho é a que se manifesta de forma explícita ou velada no ambiente de trabalho e a mais complexa de ser abordada, uma vez que existem tipos e níveis de homofobia no trabalho e seu tipo de manifestação depende do tipo de ambiente de trabalho, incluindo a cultura da organização e, principalmente, do cargo ocupado pelo trabalhador e seu gênero. Ou seja, existe uma divisão social e sexual da homofobia no ambiente de trabalho. Trabalhadores gays homens ou mulheres, que ocupam cargos operacionais ou gerenciais não são tratados e não sofrem atos homofóbicos das mesmas formas e intensidades.

A homofobia na escola se confunde com o bullyng, porém sendo uma ação diferente em forma e intensidade. Existem os atos de bullyng homofóbico, ou seja, atos de intimidação de colegas valentões contra crianças ou adolescentes gays por sua orientação sexual, mas a homofobia na escola inclui todas as manifestações de homofobia explícita ou silenciosa contra indivíduos homossexuais por colegas, professores ou qualquer outra pessoa que integre o ambiente escolar. A homofobia na universidade é uma das menos estudadas e uma das mais graves, denominada de homofobia silenciosa. Como o ambiente acadêmico é o ambiente da produção do conhecimento de alto nível em nossa sociedade os atos de homofobia na maioria das vezes não são explícitos e ocorrem de forma indireta, velada, através de atos de boicote, desvalorização do trabalhador, diminuição da autoestima, invisibilização e falta de reconhecimento e oportunidades. Finalmente, a homofobia pode ocorrer de forma explícita e ser comprovada em um único ato homofóbico, como por exemplo a repressão e/ou proibição de um beijo afetuoso de um casal de homossexuais em um restaurante, ou pode ser lenta e na maior parte das vezes silenciosa, como o ato de demissão de um profissional de alto nível, tais como executivos de empresas ou professores universitários.

Na maioria das empresas e instituições de ensino superior privado no Brasil é propagada uma pseudo cultura de tolerância à diversidade, desde que seus executivos e professores não assumam de forma explícita uma orientação homossexual e reivindiquem ser tratados como todos os demais executivos e professores heterossexuais. Na medida em que um executivo ou professor assume publicamente uma orientação homossexual a homofobia silenciosa tem início e o processo de boicote e invisibilização começa afetando negativamente a autoestima desses profissionais que são colocados no que se denomina de “geladeira”, sendo sistematicamente boicotados, não desafiados e não reconhecidos, o que acaba levando a sua demissão. 

Paulo Cogo é professor de Psicologia e Psicólogo Especialista em Psicologia Transpessoal pela UNIPAZ, atuando nas áreas clínica e organizacional, dentro do enfoque da Psicologia Afirmativa; Doutor e Mestre em Sociologia pela UFRGS; 
 

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A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

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