Com o advento da Nova República, os movimentos sociais ampliaram a sua atuação e, inseridas neles, as Organizações Não-Governamentais, ONGs, passaram a ocupar um lugar de destaque na conjuntura democrática nacional. Vinculadas diretamente às demandas populares, elas inauguraram, no âmbito da sociedade civil organizada, um fazer interativo técnico-político, como um instrumento de combate à exclusão social e ao elitismo político, instituindo a própria esfera pública, como espaço mais amplo do que o de atuação dos governos.
Tal característica se constitui em um ganho da sociedade brasileira como um todo, contribuindo para o surgimento de uma concepção mais integrada entre direitos e políticas públicas, com destaque para as sociais. Preocupação essa, até então, ausente nas agendas de reivindicações dos veículos de representação popular, nas definições do sistema de proteção nacional e nos planos de desenvolvimento.
Assim, nascidas do compromisso político num determinado momento histórico, os seus objetivos estão fundamentados em questões comunitárias abrangentes e ultrapassam os interesses econômicos particulares e de poder de seus membros. Possuem, ainda, uma cultura organizacional evidenciada por um sentido de identidade muito forte, ao qual se atrela a sua missão social. Na década de 1990, esse tipo de organização consolida mais uma característica, sendo reconhecida como peça importante na formação de uma rede internacional de solidariedade, cujo fio condutor é a reivindicação de direitos de cidadania, em escala mundial.
No Brasil, especificamente, as ONGs fazem parte dos novos movimentos sociais e têm, como pontos de convergência, os princípios do desenvolvimento humano e do alargamento da participação cidadã.
Dentre os desafios enfrentados por aqueles que trabalham em uma ONG, captar recursos para viabilizar suas atividades é um dos maiores, senão o maior. Mudanças na legislação tributária feitas pelo governo FHC engessaram uma das fontes de financiamento mais significativas para as entidades do terceiro setor: a doação de pessoas físicas. No Brasil, são elas quem doam, como, por exemplo, nas Igrejas. Porém, entramos num período de desincentivo a essa prática. Por isso, grande parte das ONGs são na realidade ODGs, Organizações Dependentes de Governo. Precisam de recursos que recebem do Estado por convênios.
No caso do Grupo Gay da Bahia (GGB), quer que membros da comunidade homossexual e simpatizantes colaborem com as causas do segmento. A entidade resolveu desde já estimular em particular os homossexuais que façam doações em vida dos seus recursos financeiros e patrimoniais acumulados durante a sua vida para entidades que trabalham no combate a homofobia.
O GGB, com sede no Pelourinho em Salvador, desde a sua fundação já distribuiu mais de dois milhões de preservativos, centenas de milhares de folhetos educativos orientando as pessoas na questão da infecção do HIV e Aids. A ONG funciona como um canal aberto entre a sociedade e os homossexuais, no combate ao preconceito, atuando na promoção de uma sociedade respeitosa.
Atualmente, somente pessoas jurídicas que declaram seu IR com base em lucro real – instrumento usado pelas grandes corporações, que correspondem a menos de 3% do total de empresas no país – têm o direito de deduzir do seu imposto às contribuições.
Uma base expressiva de pessoas físicas como doadoras também pode garantir autonomia às ONGs. É por isso que o Greenpeace enfrenta governos e empresas no mundo inteiro. Entretanto, é claro que nem todas as instituições têm o apelo e a estrutura de um Greenpeace para atrair simpatizantes planeta afora. Por essa razão, diversificar as fontes de financiamento é a chave para driblar os problemas financeiros. E aí também entra o dinheiro do Estado.
O problema não está na origem do recurso, mas o que se faz com ele. Criou-se uma mentalidade de que as ONGs não podem utilizar fundos públicos. Mas quantas atividades de luta contra, não só a homofobia, mas o analfabetismo e serviços de saúde são feitos por boas entidades no país todo, através de convênios? Se não fossem elas, a situação poderia ser bem pior.
É difícil acreditar que o crescimento do número de ONGs no Brasil não seja saudável. Afinal, quanto mais organizada, mais democrática é uma sociedade. Qualquer discussão com o intuito de regular esse setor deve primar pela transparência no uso dos recursos destinados a amenizar as ilimitadas mazelas brasileiras. Porém, o discurso não deve ficar apenas no campo da repressão. Há entidades sérias – a maioria, diga-se de passagem, que necessita de estímulo e de liberdade para atuar.