E no sábado, quem esperava ver o primeiro beijo gay na Rede Globo, na novela Duas Caras, entre os personagens Bernardinho e Carlão, ficou na vontade. Apesar dos dois terem firmado um pacto de união estável em um cartório, os telespectadores tiveram que engolir um comentário pra lá de homofóbico feito por parte do juiz da “cerimônia” – “em tanto tempo de serviço, nunca vi tamanha frescura”, afirmou ele.
O capítulo final foi ao ar em dois dias, por ter ficado longo demais. Apesar de toda a expectativa em torno da cena gay do final da novela, a direção da emissora não concordou com a sua gravação, ou seja, o tal beijo não foi ao menos gravado. Outra cena polêmica, na novela Beleza Pura, também foi censurada pela cúpula da Rede Globo, um apagão cortou a cena que levaria ao ar um falso beijo gays entre os personagens Renato e Mateus – na verdade é a personagem Helena se passando por homem.
Tanto conservadorismo é defendido com o Manual de Qualidade da emissora que julga que uma cena gay poderia ser desconfortável para a maioria dos telespectadores. No jornalismo, área que a Globo já foi muito mais cuidadosa, as matérias com gays estão mais em voga. Esta semana, a capa da revista Época, da Editora Globo, trouxe um casal de militares gays. A realidade parece estar mais moderna do que as tramas ficcionais da emissora, que perde espaço para outros canais nos folhetins.
A Rede Record, pertencente à Igreja Universal do Reino de Deus, já possui mutantes em suas novelas e inclusive um núcleo de mutantes gays, na telenovela de Mutantes, que segue o sucesso de Caminhos do Coração como carro chefe da Record. Apesar de “modernosa”, a Record também não liberou o amor entre homens. O que será que acontece?
O grande medo das emissoras não é perder credibilidade com o público, este entenderia facilmente que se trata de uma ficção e que assistir a um beijo não mudaria em nada a vida do espectador. Principalmente se for uma cena bonita de se ver, que pode até os inspirar ao romantismo e ao entendimento, abrir a cabeça sobre a questão. O grande problema está no medo de perder anunciantes. É fato que os grandes conglomerados fogem de polêmicas e não querem aliar suas marcas ou levantar bandeiras, por isso nossa televisão é tão alienada. Anunciar em um programa que tem beijo gay, na cabeça dos anunciantes, é arriscado.
Quem não se lembra do primeiro beijo gay na MTV em que o patrocinador, a marca de pastas de dentes Close Up, do programa “Beija Sapo”, no qual rolou a tal bitoca, em 2005, preferiu não ter sua participação no episódio voltado aos casais homossexuais. Na mesma linha, a Volkswagen pagou cerca de 200 mil reais para abafar um processo da Associação da Parada do Orgulho GLBT contra a montadora por conta de uma propaganda capciosa em que os gays eram ridicularizados. Uma das cláusulas do acórdão foi que a montadora não fosse mencionada como patrocinadora do evento, embora tivesse comprado a cota master para encerrar o tal processo.
A duras penas, revistas gays sobrevivem em um mercado saturado de títulos, porém com poucos anunciantes. Sites não conseguem patrocínio facilmente e anunciantes fogem como diabo da cruz para não terem suas marcas aliadas a este mercado, mesmo quando é dado que os gays gastam 40% a mais do que os heterossexuais. Gays estão virando os pobres fora do Carnaval. Em época de Parada são disputados e queridos, fora disso, vivem a triste realidade, sempre, como faz questão de relembrar a rede Globo, sem direito a um final feliz.