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BBB 10 é ótimo exercício contra a homofobia, principalmente a internalizada

Redação Lado A 14 de Janeiro, 2010 20h14m

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Há 3 dias começou o BBB mais gay de todos. Uma drag, um gay assumido e uma lésbica. Vários simpatizantes, alguns bissexuais no armário de certo e com certeza alguns homofóbicos na casa. Apesar de militante gay, gay assumido, assumo: o programa está conseguindo me chocar e criar um mal estar. E conversando com amigos percebi que não sou o único.


Boa parte dos gays não gosta de bichices, ou “afetação”, pelo menos não publicamente. E é isso que nós vemos na tevê com o programa. Incomoda ao ponto de eu não conseguir assistir as “bichas” fervendo na tevê por muito tempo. Agora imagine aos héteros. Discuti com amigos que também compraram a versão 24h na tevê a cabo, se o programa vai acrescentar algo, ajudar a diminuir o preconceito, ou causará efeito contrário. Ainda é cedo para afirmar. Mas concluímos algumas idéias interessantes.


Já teve gay discreto, intelectual, “normal” no programa e eles não acrescentaram nada para a nossa causa. E é sempre assim. Todo mundo fala de militância e parada gay mas quem sempre coloca a cara a tapa é a drag, a travesti, a gayzinha fervida. Ou seja, a gente fala, mas quem de fato milita, dá visibilidade e sofre mais são os gays afeminados e que manifestam alguma homoafetividade em público. Temos que lutar não pelo nosso direito de casar e ser discreto, temos que buscar respeito pela travesti, pelos gays mais espalhafatosos, pois estes realmente são as maiores vítimas da violência homofóbica.


Apesar do reforço do estereótipo, o BBB10 é uma oportunidade ótima para trabalharmos a questão da aceitação. Fala-se do respeito e que os gays mais abusados não respeitam os outros. Mas a questão é: todos tem o direito se serem como quiserem. O respeito é obviamente necessário mas ser diferente é direito destas pessoas. Claro, o limite do espaço do outro deve ser respeitado, mas assistir ao Serginho dançando como mulher, a Dimmy falando no feminino com o Sérgio e de si mesma, não é nenhuma quebra de decoro, é ser autêntico e feliz. Não podemos cair no discurso de que isso fará mal à imagem dos gays ou que gays devem ser discretos. Não somos únicos, cada um que zele pela sua imagem, agindo com a conduta que acredite ser a certa. Não podemos dar mais armas para o preconceito.


A coragem da equipe do Big Brother Brasil não pode ser deixada de se comentar. É visível que o programa corre risco de perder patrocinadores fixos, pela homofobia. Mas muitos estão lá, acreditaram na proposta. E isso é positivo para a própria mídia GLS, para a comunidade. São os primeiros gays assumidos fervidos da casa. Os outros (o urso, o intelectual, o enrustido, entre tantos) também saíram do armário, tiveram as suas chances e não aproveitaram.


Já presenciamos cenas emocionantes, da fala do pai do Serginho que disse que não gostaria que seu filho fosse diferente. Da filha, a jornalista Angélica, dizendo que o pai acredita que gays são doentes. Da drag que sonha em reunir a família. Apesar de tanto glitter e barulho insuportável, frases de efeito, avista-se ali seres humanos maravilhosos, com histórias de vidas marcadas pelo preconceito, e isso é positivo e sem preço. Precisamos olhar por de trás do arco-íris, lá veremos que todos somos realmente iguais, mesmo com todas as nossas diferenças. É assim que precisamos ver e que os héteros nos vejam.


Ainda teremos três meses de programa no ar, quem sabe ainda não teremos um dos três gays assumidos da casa como vencedor. Já tivemos um gay que ganhou o programa e não gerou catarse na discussão do casamento gay ou da lei contra a homofobia. Quem sabe a drag, o gayzinho ou a lésbica do programa não engatem, em conjunto, uma discussão mais forte. Apesar da ojeriza inicial, do surgimento do nosso próprio preconceito internalizado, o que acredito é que teremos uma grata surpresa.

Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

Redação Lado A

A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

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