Arquivo

Ser visivelmente gay não significa necessariamente ser visivelmente aceito

Redação Lado A 17 de Junho, 2010 18h22m

COMPARTILHAR


Oi pessoas, nessas duas semanas que passaram, aconteceram algumas paradas gays Canadá afora. Aqui em Edmonton, o que seria o local mais “pé-vermeio” (como meu pai já dizia) do Canadá, teve uma parada meio sem graça, umas festas meia boca e um solzão que deu até gosto de ficar lá fora enchendo a cara.


E a mesma discussão voltou ao topo da lista: Seria a parada gay um Carnaval fora de época? Bom, há quem diga que sim, outros dizem que não… e a festa continua. Eu ia escrever sobre isso, mas decidi traduzir um texto muito bom, do Brett Taylor, publicado pelo editor da revista OUTlooks, edição de junho de 2010. A OUTlooks é tipo uma Lado A canadense com circulação nacional (no Canadá né), o site é www.outlooks.ca  se você quiser dar uma olhada lá.


“A visibilidade gay que emergiu depois das manifestações de Stonewall foi um alívio para a vida secreta e encontros clandestinos na era pré-Stonewall. O povo gay não aceitava mais ser invisível. Contudo, mesmo sendo possível para as pessoas gays lutar contra a discriminação do seu novo patamar de visibilidade, a visibilidade propriamente dita não garante aceitação de modo algum.


Geralmente essa presença marcante de homossexualidade e o crescimento e inserção da cultura gay saía pela culatra pois a sociedade tentava nos colocar de volta no armário aonde a sociedade acreditava que pertenciamos. Vamos e venhamos, a história continua a mesma. Visibilidade, por definição, é a habilidade de ser visto, observado, detectado. A decisão da comunidade (gay]) após os motins (de Stonewall), de se tornar visível foi uma “ação” comprometida pelo fato de ser apenas “visível”, é uma atitude essencialmente muito “passiva”. Ser visível no entanto é muito diferente do que “ser parte do público”.


Historicamente, para um indivíduo ou grupo, ser “público”significa que ele desempenha um papel integral na vida da comunidade. Esse status de “público” dava ao individuo os direitos e deveres de um cidadão. É esperado que um cidadão tome parte na sociedade de uma maneira completa e aberta, e suas opinião e vida são tratadas com respeito, incluindo proteção contra abuso e perseguição. Resumindo, eles seriam parte essencial e indispensável do corpo político.


Pelo mundo a fora, gays são mais visíveis hoje do que nunca antes, mas na sua maioria, eles não são permitidos a fazerem parte do “público”.  Ainda tem negados, mesmo nos países mais avançados – Canadá, por exemplo – alguns dos seus direitos como cidadãos. Por exemplo, nos Estados Unidos da América continuam a lutar CONTRA o direito de casamento ou de alistamento militar. Em 30 estados, ainda é permitida a discriminação contra um homossexual quanto a moradia e trabalho; e não há lei federal nos EUA que preveja discriminação contra homossexuais. A Corte Suprema dos EUA até alegou que não há direito constitucional à privacidade quando o assunto é atividade sexual do mesmo sexo.


Crescimento de visibilidade para as nossas comunidades não garantiu os totais direitos como cidadão – o direito de ser “público” ou, de um ponto de vista social, a segurança e respeito para nos expressam totalmente… a qualquer hora e lugar! Eu acho muito irônico que a visibilidade para a comunidade GLBT imediatamente reforça o estigma social ao nos identificar como uma subclasse social – “gays”.


Ao não sair do armário, pode ser dito que um individuo gay poderia participar mais intensamente da sociedade como um membro integral da comunidade local; e muitos de nós seguimos essa rota no princípio. Isso significa (e isso também é irônico), que pessoas gays podem ser “públicas” e tratadas igualmente em todos os aspectos, contanto que elas não sejam “visiveis” como tais. Vai entender!
É quando nos tornamos muito visíveis, individualmente ou em grupo, que a discriminação e os crimes de ódio começam.


Numerosos estudos provaram que crimes baseados em sexualidade despontam drasticamente durante e depois marchas, protestos, Paradas do Orgulho, e outros eventos públicos GLBT.
As celebrações do ano passado falam por si só.


Marchas exigindo direitos iguais para individuos GLBT na Polônia e Rússia resultaram em confrontos violentos entre polícia e protestantes, enquanto ativistas ucranianos decidiram não ir as ruas por causa de uma proibição municipal. “O clima era totalmente diferente em Moscou já que a polícia violentamente dispersou manifestantes na marcha do Orgulho eslovaco, que havia sido banido pelas autoridades,” afirmou a Anistia Internacional. Entre 25 e 80 ativistas foram presos na Rússia.


Eventos de Orgulho Gay fornecem maior visibilidade pública para o povo GLBT, no entanto, são esses mesmos eventos que dão inicio a um maior indício de violência e crimes odiosos mundo a fora. Dados disponíveis comprovam que violência baseada em orientação sexual e preconceito de indentidade de gênero é uma porção significativa nos crimes violentos de ódio, e que esses crimes, contra individuos GLBT, são mais agressivos e propositadamente mais violentos que outros tipos de ataques motivados por preconceito.


Infelizmente, mesmo que a discriminação anti-gay, abuso e violência fossem eliminados hoje, ainda não seríamos considerados “público.” Para ser totalmente parte do “público” precisaríamos ser considerados iguais na comunidade. E, para ser considaderado igual, teriamos que poder demonstrar nossa orientação sexual e discutir nossa sexualidade abertamente, como os heterossexuais o fazem. Então, até que sexualidade gay seja removida do reino do “armário” ou algo que tenha que ser mantido “privado”, pessoas gays nunca serão cidadãos por completo. Pelo menos é assim que eu vejo.”

E eu também.

Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

Redação Lado A

A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

COMPARTILHAR


COMENTÁRIOS