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Jovem gay é impedido de doar sangue em Belo Horizonte

Redação Lado A 11 de Abril, 2012 21h49m

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O blogueiro e produtor cultural Danilo França, de 24 anos, de Belo Horizonte, resolveu doar sangue pela primeira vez em sua vida, seguindo o apelo de campanhas que dizem que tal ato é um importante ato de amor.  No último dia 10 de abril, terça-feira, ele foi até o Hemominas e respondeu a um questionário que, entre outras perguntas, indagava se ele havia feito sexo com um parceiro do mesmo sexo nos últimos 12 meses. O entrevistador teria mudado o tom da conversa ao saber que ele era homossexual, mesmo assim seguiu com as perguntas e dispensando o candidato posteriormente por não se encaixar no perfil de pessoas aptas a doarem sangue.

França não sabia, assim como a maioria da população, que a portaria do Ministério da Saúde número 1.353, sobre hemosegurança e doação de sangue, reformulada no ano passado, exclui qualquer homossexual que tenha feito sexo nos últimos 12 meses, mesmo que tenha usado preservativo em todas as relações, mesmo que tenha tido apenas um parceiro. Foi a primeira vez que França se sentiu discriminado por ser homossexual na vida. Ele postou em seu blog todo o ocorrido e enviou reclamações para o Hemominas e entidades de Direitos Humanos.

A Hemominas respondeu para França que apenas segue as medidas adotadas pelo Ministério da Saúde. “Em relação à triagem de doadores, cumprimos as normas determinadas pela Portaria MS 1.353 de 13 de junho de 2011 que determina que os doadores sejam avaliados quanto à exposição a situações de risco acrescido, para as quais determina prazo de segurança para liberação para a doação”, disse a empresa em resposta a França.

O assunto não é novo, a proibição está vigente desde a década de 80 em muitos países, poucos deles, a maioria europeus, retirou a proibição. Apesar do termo “grupo de risco” não mais existir para a epidemia do HIV, criou-se outro: o comportamento de risco. Como exames mais modernos encareceriam o processo de seleção de materiais hemoderivados, optou-se então por restringir o perfil dos doadores que podem portar doenças ou estar em janela imunológica. A discriminação existe, é institucional e hipócrita já que há gays que ainda doam sangue, porém mentem na hora de responder ao formulário, mesmo configurando crime.

Abaixo, confira o desabafo de Danilo em seu blog (http://fragmentostalveznecessarios.blogspot.com.br):

Grupo de risco: discriminado

Hoje tentei doar sangue pela primeira vez, mas não consegui. Motivo: sou gay. Simples e cruelmente. Fui impedido logo na entrevista pelo médico da Hemominas. Tenho um único parceiro sexual há mais de três anos, mas como sou homossexual, então me encaixam automaticamente num conceito estúpido e já ultrapassado de “grupo de risco”.

– Quantas parceiras sexuais você teve no último ano? – perguntou o médico da Hemominas.
– Um – respondi.
– Já teve relação sexual com prostitutas?
– Não.
– Já usou drogas injetáveis?
– Não.
– Teve relação sexual com uma pessoa do mesmo sexo no último ano?
– Meu parceiro atual é homem.
Depois dessa resposta já notei uma reação diferente por parte do médico. Logo após, ele fez outras poucas perguntas e me informou:
– Infelizmente você não poderá doar sangue hoje. – Ele pegou uma apostila da Hemoninas e acrescentou – Conforme o Ministério da Saúde, você pode ver nesta tabela aqui, homem que teve relação com outro homem nos últimos doze meses se apresenta como grupo de risco e por isso…
– Então gay não pode doar sangue? Só por ser gay?
– Bem, isto é muito contestado mesmo, mas são as normas do Ministério da Saúde.

Saí da sala atordoado, nem me lembro do que disse ao médico depois disso. Olhei para as outras pessoas que estavam na sala de espera para a entrevista com o médico e senti vergonha não sei de quê. Nesta hora eu me senti completamente discriminado. Sim, eu fui discriminado por causa de minha sexualidade.

Se o médico tivesse me mostrado um exame de sangue que apontasse que possuo uma doença que está na lista do Ministério da Saúde, tudo bem. Sem discussão. Mas eu nem cheguei a fazer exame nenhum, fui descartado logo na entrevista por ser gay. Em pleno 2012 o Ministério da Saúde do Brasil ainda acha que os homossexuais são um grupo de risco? Todo mundo sabe que se você transar sem camisinha já está em risco, seja você gay, hétero, transexual, bissexual, ou qualquer outra coisa.

Então é isso, pessoal. Se esse absurdo continuar, o recado é claro: se você é gay e tem uma vida sexual ativa, não vá doar sangue. Não perca seu tempo sendo discriminado. Enquanto isso eu tenho esperança de que essa norma furada do Ministério da Saúde ainda seja revista por pessoas realmente competentes.

Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

Redação Lado A

A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

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