O quadro “O que você faria?”, do Fantástico, é excelente. Há dois anos eu já assistia o original norte americano, no ar desde 2008, na internet. A versão brasileira tem uma maior importância. Por aqui, não contamos com o senso comunitário que eles tem por lá e nem com as instituições que no Brasil não cumprem com os seus papéis. A Justiça, além de lenta, chega a penas ridículas e processos morais terminam em cestas básicas. O jornalista Ernesto Paglia é um dos profissionais mais sérios que temos. Talvez, falte explorar esse diferencial cultural no quadro e criticar as instituições, incentivar a alteração das leis, valorizar o processo por meio jurídico e a denúncia, que às vezes abrimos mão por causa da descrença, burocracia, vergonha e custos. É preciso mostrar a importância de nos posicionarmos frente ao nosso círculo vicioso que reforça as injustiças e multiplicam os casos mostrados no quadro. No último programa, por acaso sobre homofobia, citaram o disque 100, da Secretaria de Direitos Humanos, para denúncias contra a comunidade LGBT, a falta de lei contra a homofobia, mas é preciso fazer mais, sempre é possível.
Esta semana, eu passei por situação digna de estar no programa, mas infelizmente era algo real. Como uma pessoa politizada, que já passou por situação semelhante e fã do quadro, agi abaixo da minha própria expectativa.
Estava chegando ao Shopping Parque Barigui, para minha sessão semanal de massagem, quando deparei com a cena de um rapaz circulado por cinco seguranças e uma gerente da loja Zara. Outros três acompanhavam em motos e uma viatura o desenrolar. Ouvi a gerente dizer que a caixa do perfume estava vazia e deduzi que ele fora acusado de furtar um perfume. Queriam revistar a bolsa do rapaz. O homem segurava uma sacola da Zara, logo, era cliente da loja. Fiquei ali um minuto acompanhando até que o homem, a gerente e os seguranças foram até um lugar “reservado”, sugerido pelos seguranças, logo imaginei uma salinha. Comentei com um segurança e ele disse que iriam para uma sala onde teria uma câmera, que não precisava me preocupar com o rapaz. Estava atrasado, não filmei, não peguei o contato da pessoa, não me manifestei.
Em 2003, quando o mesmo shopping abriu, fui abordado enquanto conversava com um grupo de amigos gays sobre consumir bebida fora da praça de alimentação. Por três seguranças! Bebi o chá, joguei fora o copo e continuamos ali, no mesmo local. Os seguranças ficaram rondando a gente, de cara amarrada, nos intimidando. Foi homofobia pois estávamos na frente de uma loja que inaugurou naquele dia e o dono se incomodou com a nossa presença na frente de seu empreendimento milionário e acionou os seguranças. Não os processei na época mas fiz um auê na mídia. Depois, fizemos encontros gays nos shoppings pois choveram denúncias de casos de salinhas. Mas o abuso continua… Não aprenderam nada.
Depois da minha massagem, que apesar de ter tirado as minhas dores da musculação, não aliviou em nada a minha tensão depois de presenciar tal cena, fui à Zara, conversar sobre o que aconteceu e manifestar a minha preocupação. Não me deram satisfação e ainda me destrataram. Como cliente da Zara, afirmei que gostaria de saber quais provas existiam para abordarem alguém daquela maneira, do lado de fora da loja, no estacionamento do shopping. Afinal, poderia em tese acontecer com qualquer um, se não houvesse provas, e, em todo caso, o constrangimento não se justifica. A gerente da seção masculina, que estava lá fora, disse que eu não tinha nada a ver com o ocorrido, apenas afirmou que foi um caso isolado já resolvido e, repetindo o despreparo com seus clientes, afirmou que tinha mais o que fazer. Perguntei o seu nome, ela não respondeu, deu as costas e foi para o fundo da loja.
Hoje vou novamente à loja, ao shopping, vou encaminhar este texto ao colega jornalista Ernesto Paglia. Espero que o rapaz esteja bem, leia isso e venha se manifestar. Terei prazer em testemunhar o abuso que vi. Acusado falsamente ou com razão, ele foi constrangido, ponto. E eu, infelizmente, demorei para me posicionar. Mas nunca é tarde…