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Resposta ao Vilão do Grindr: Porque nós, garotos de Ipanema, escolhemos estar solteiros

Bruno Uerba 11 de Abril, 2014 19h24m

O artigo publicado sobre o “Vilão do Grindr” criou um fogo cruzado gerando mais polêmica do que aquele boy magia que a gente descobre ser passivo. O tema causou tanto burburinho na comunidade gay que até hoje recebo e-mails dos leitores. Resumindo: um sucesso.

Por esse motivo, não poderia deixar de publicar a réplica, o outro lado da moeda, afinal, os “Garotos de Ipanema” também têm o direito de se defenderem. E eu, numa posição de investigador da natureza humana, sinto-me na obrigação de divulgar um resumo das mensagens que recebi e sintetiza o pensamento da “oposição”. Contudo, ainda assim, sigo de forma imparcial.. Peço, de antemão, desculpas aos que vão me odiar ainda mais e aos que irão me bloquear no Facebook nos próximos dias. Vou tentar sobreviver.

Apresento-lhes a resposta dos Garotos de Ipanema
 

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Hoje em dia, as pessoas se odeiam por pouco. A Internet, de todos os malefícios, criou a pior coisa: um bando de covardes que se esconde atrás de computadores e celulares pra atacar as pessoas de forma anônima. O que o vilão do Grindr fez é uma ofensa, um ato escrupuloso, um estupro:
#nós não merecemos ser estuprados.
 
Que fique bem claro. O fato de nós, garotos de Ipanema, sermos sarados e termos um estilo de vida diferente do seu não lhe dá o direito de nos julgar e achar que somos obrigados a dormir com você pra provar que somos seres humanos. Isso é uma ignorância tremenda, é o mesmo sentimento de repulsa que as mulheres tiveram quando souberam sobre a pesquisa do IPEA, em que os homens aprovam o fato de elas serem estupradas se usarem roupas curtas. Não invertam os valores.
 
Preconceito nunca foi novidade. Você mesmo não se aceita e por isso está dando com a cara na porta. Coloque a mão na cabeça e busque na sua memória a última vez que procurou alguém semelhante a você no aplicativo. Já parou pra pensar quantos “foras” poderia distribuir? Certamente, devem existir pessoas que lhe desejam e você nem as percebe porque está gastando energia para estar com quem não lhe dá a mínima.

 Grindr é um aplicativo democrático e nos permite o direito de escolha. Não precisamos ir pra cama com quem nos desperta zero interesse pra provarmos ao mundo que somos dignos de um pedacinho no céu. Se você ganha mil reais por mês não faz o menor sentido querer jantar no Fasano todos os dias. Se você não malha, porque os sarados têm que lhe desejar? Sabe quanto custa manter um corpo em forma? Tudo tem seu preço. É o mesmo que desejar um apartamento na Vieira Souto sem nunca tirar a bunda da cadeira pra trabalhar. Se quiser mesmo usar a bunda, move your ass e corra atrás do prejuízo, porque no nosso mundo isso se chama inveja, cobiça, que também é um pecado capital.

Somos o que você quer ser e nunca foi por puro comodismo. Temos o corpo que está na sua mente nos momentos mais íntimos, com todas as curvas possíveis que você deseja com toda a sua alma e só tem acesso em filmes pornôs. Saiba que tudo isso é fruto de um investimento físico árduo. Fazer dieta e treinar diariamente exige determinação, disciplina, persistência, características essas que podem ser facilmente transpostas para o dia a dia, resultando em sucesso na carreira e vida pessoal – fato!

O dinheiro que gastamos com esteroides e suplementos importados pra ter um corpo escultural é o mesmo que você gasta com suas prioridades para ser quem você é. E se não tem esse dinheiro a culpa não é nossa. Não nos crucifique pelo sistema de merda que estamos todos inseridos.

Sim, nós temos cultura. Acompanhamos a política do país; lemos livros, jornais e revistas de temas variados, algumas vezes no caminho para o trabalho, outras antes de pegar no sono e o fato de não lermos na sua frente ou enquanto surfamos não quer dizer que todos são acéfalos. Seria o mesmo que dizer que quem não surfa tem uma vida de bosta. Cada um na sua onda, cada um no seu quadrado – e estamos todos quites.

Tomamos açaí – você um Milk Shake do McDonald’s. Acordamos às 6 da manhã pra treinar todos os dias – você estica o sono por mais duas horas. Pegamos praia no Coqueirão – você no Posto “X” ou nem vai pelo receio de se expor. Escutamos Rihanna e Katy Perry – você também. Finalmente uma afinidade. Quem sabe não surge uma relação a partir disso?
Pah! Tapa na cara.

Agora, quem levamos pra cama só diz respeito a nós mesmos. A vida é feita de escolhas o tempo todo. Qualquer um de nós pode tornar-se você amanhã e o contrário também. É uma linha tênue entre ser ou não um Garoto de Ipanema. Escolha o seu estilo de vida e respeite os demais. E se não estiver satisfeito com a própria presença…

#chucapraalma.

Consulte um psicológico e procure cuidar mais do corpo e da mente. Aprenda a aceitar as diferenças e conviva com os seus fantasmas. O mundo real é muito real, algumas vezes chega a ser cruel e só será realmente um lugar digno de se viver quando todos forem bem resolvidos consigo mesmos.

Estamos solteiros pelo mesmo motivo de todas as pessoas.  Não estamos obcecados com a ideia de alma gêmea, casamento, felicidade apostada num anel com direito a mudança de status no Facebook. Ser solteiro nem sempre é dúvida, mas escolha. Alguns simplesmente optam por investir em outras prioridades até que alguém especial apareça e faça o coração ir a mil por hora. Há, sem sombra de dúvidas, uma parcela de pessoas com dificuldades em estabelecer intimidade com outras, mas não dá pra julgar um biscoito pelo pacote. Espane a poeira de sentimentos ruins que não lhe fazem bem porque a vida é curta e quem não se diverte perde a vibe.
 

‘Se liga, manezão’.
 
Ass: Os garotos de Ipanema
 
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Aos 45 do segundo tempo, fico pensando com os meus botões que existe realmente um abismo entre sarados e não sarados, entre ricos e pobres, “machos” e afeminados, moradores da Zona Sul e moradores da Zona Norte. Sempre vai haver motivos de guerras para as diferenças. Sábio é aquele que sabe transitar pelo mundo sem sair da sua aldeia, que tem o discernimento pra entender que estamos de passagem na Terra e que nenhum de nós foge das possibilidades de tornar-se num mendigo ou mendigar por companhia. Porque sim, somos todos moradores de rua que vagam perdidos pelo mundo na esperança de encontrar amor, um porto seguro, um lar e o conforto de um abraço. E usamos o Grindr como uma esmola pra alma, um petisco pra solidão, um lanchinho pra passar o tempo ocioso, pra suprir as necessidades do ego e saciar a fome de sexo. Mas fiquemos atentos, pois, embora tenhamos sentimentos e desejos, nesse território estamos todos disfarçados – e de máscaras. 

Bruno de Abreu Rangel

brunorangelbrazil@hotmail.com

 

Bruno Uerba

SOBRE O AUTOR

Bruno Uerba

Bruno de Abreu Rangel é um celebrado escritor carioca e tem três livros publicados. Atualmente ele reside nos EUA e é colunista da Lado A desde 2014.


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