A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n.º 4275, movida pela Procuradoria-Geral da República em 2009 deve finalmente entrar em discussão ainda este ano no Supremo Tribunal Federal (STF). A ação questiona o reconhecimento do direito das pessoas transexuais mudarem seu nome e sexo antes da realização da cirurgia de readequação genital (mudança de sexo). Para a Procuradoria-Geral da República, a apresentação de laudos psicológico e psiquiátrico apontando a patologia de disforia de gênero deveria bastar.
Mas o Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual (Gavds) e a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (Abglt) prometem incluir as travestis na discussão, e fizeram no mês passado um pedido de ingresso como amici curiae, amigos da corte, para serem ouvidos durante o julgamento. Para Paulo Iotti, advogado representante das entidades, “Isso provavelmente se deu por desconhecimento da diferença entre travestis e transexuais ou então pela PGR não ter se atentado sobre o drama absolutamente equivalente que sofrem as pessoas travestis”. Para o advogado, não se tratou de discriminação a não inclusão das travestis, uma vez que o órgão tem um extenso e favorável histórico de apoio e sensibilidade às questões LGBT, mas seria possível aplicar a mesma resposta às travestis, que também podem apresentar laudos atestando seu transexualismo, também considerado um transtorno de identidade de gênero.
A discussão promete ser difícil: “A lei fala que qualquer pessoa pode mudar seu prenome (“primeiro nome”) se provar que seu “apelido público notório” (seu nome social) é diferente de seu (pre)nome civil e nada fala sobre mudança de sexo no registro civil, donde não há limites semânticos que impeçam a interpretação evolutiva da lei para proteger os direitos de travestis e transexuais. Há uma lacuna, uma omissão da lei, não uma proibição a transexuais e travestis”, argumenta o advogado. O grupo quer ainda que seja dispensado o laudo médico para conseguir as alterações, pois entende que “o direito à identidade de gênero relaciona-se com a autonomia moral da pessoa, inerente à dignidade da pessoa humana, que não pode ser condicionado a cirurgias ou à autoridade médica”.
O IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família, já aprofundará as discussões como de amicus curiae nesta ação. As ONGs do Rio Grande do Sul (Nuances e Igualdade) também pediram para acompanhar o julgamento mas tiveram o pedido negado pelo relator do caso, o Ministro Marco, em 2013. Há um ano o ministro analisa o caso e deve se manifestar em breve. O processo criado em 2009 a cada dois anos fica parado, quando há alguma movimentação, mas não é concluído. Enquanto isso, travestis e transexuais, muitas transexuais que aguardam as cirurgias do SUS por décadas precisam recorrer à Justiça comum para mudar de nome mas raramente conseguem a alteração de seus gênero de nascimento. No fim, apenas as que possuem 40 mil para realizar a cirurgia e dinheiro para pagar um processo conseguem o seu final feliz.
Na Argentina, a Lei de Identidade de Gênero, aprovada há dois anos, impactou de forma favorável na qualidade de vida das transexuais do país. Segundo a lei de lá, o gênero é definido por auto percepção. Na Austrália, a opção sem gênero definido se tornou uma possibilidade que evita constrangimentos. Na Índia, as trans foram reconhecidass como terceiro sexo, em que não se define como nem masculino ou feminino.