Minha primeira vez em uma igreja evangélica inclusiva

Sou católico de batismo mas me identifico com aspectos de muitas religiões como a budista, xintoísta, espírita kardecista, wicca, e filosofias como a ioga e a Seicho no Ie, entre outras. Enfim, sempre fui muito aberto para o assunto da religiosidade mas nunca tinha ido a um culto em uma igreja evangélica, salvo em homenagem a um amigo que morreu tragicamente e sua mãe é pastora, há alguns anos. Neste domingo, fui a um culto de uma igreja inclusiva em Curitiba, da Comunidade Abraça-me, na qual um amigo é pastor e eu lhe devia uma visita.

No primeiro momento fiquei muito impressionado. Não havia mais do que seis meses que começaram com os cultos em uma sala de hotel e esta estava lotada quando cheguei, com mais de 40 pessoas. Já tinham banda (depois descobri que aquela era a segunda semana) e muitos “obreiros”. Se eu não tivesse acompanhado o projeto, talvez não soubesse que o trabalho era novo, aliás, eles acabaram de publicar o primeiro jornal da comunidade, motivo ao qual fui prestigiar o lançamento. Super organizados e simpáticos, fiquei mesmo bem impressionado.

Mas para quem não está acostumado, é um baque. Pessoas dizendo que falam com Deus, que Deus se manifestou por meio deles, interpretando e ensinado sobre a Bíblia, coisas que na minha religião de nascimento os padres não ousam dizer, eles se referem aos santos e suas ações, a palavra é citada como exemplo, como conforto, e deixam a interpretação livre para cada um. Deus quer isso, Deus fez isso por isso, você tem que fazer isso ou aquilo. Sem falar nas luzes coloridas e laser que iluminam o local. Nos primeiros instantes essas diferenças me incomodaram, mas aos poucos fui abaixando a guarda.

É confortante, e isso jamais havia experimentado na vida, quando o pastor ou algum participante do culto cita que Deus fez o gay e que somos merecedores de seu amor, que ele nos ama. Quando é demolido o discurso de ódio tantas vezes ouvido em outras searas que motivaram esses jovens que não abrem mão de seu louvor e religiosidade cristã a criarem uma denominação para pregar aceitação. O lindo trabalho que presenciei é por si só uma manifestação de devoção e do poder divino. Como disse, acredito que todos os caminhos levam a Deus e que a religião serve para tornar as pessoas melhores, não pelo temor, mas pela criação de comunidades sadias, baseadas em sentimentos verdadeiros de compaixão, onde um pode contar com o outro, se sentir amado e acolhido, e foi isso que vi.

Claro, em momentos de prece e vibrações exaltadas, alguém começa a fazer sons estranhos, a rezar ou ungir o outro, o barulho das vozes todas ao mesmo tempo favorecem um transe ou experiência de deslocamento dos problemas, bem como toda a aeróbica exigida na liturgia empregada com seus cantos e repetições. Vi e ouvi relatos lindos de pessoas maravilhosas para quem a orientação sexual, questão de gênero ou religiosidade são fundamentais para atingir sua plenitude como ser humano, a sua felicidade.

Nunca havia ido a uma igreja evangélica, mas ali eu soube que por mais que a maioria delas não se esforce em incluir os gays, eles estão em todas as denominações e buscarão acolhimento e amadurecimento quando estas os decepcionarem. Ali aprendi que “Deus é Mais” e que não serão religiões ou preconceitos que afastarão aqueles que buscam sua fé e paz espiritual de seus caminhos. Discordo de alguns pontos, como em todas as religiões que citei, mas eu não estava ali para encontrar algo ou julgar, apenas para testemunhar, mas acabei encontrando pessoas bacanas, tive conversas que mostraram que a fé é uma ferramenta poderosa, não de manipulação como muitas vezes pensei, mas de resistência e resiliência aos problemas diários que abatem a todos, sobretudo LGBTs. Saí de lá confortado, agradecido, energizado e ciente de que vejo Deus em todas as coisas, todos os dias, igualmente em todas as religiões e se Deus está lá, não pode ser ruim. 

Allan Johan é editor e idealizador da Lado A e assina desde 2001 o Blog do Johan

 

Redação Lado A :A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa