Quais as nossas novas Utopias?

É preciso acreditar para viver! A utopia nasce como um gênero literário — é a narrativa sobre uma sociedade perfeita e feliz — e um discurso político — é a exposição sobre a cidade justa.
 
Há pelo menos três aspectos curiosos no uso dessa palavra. O primeiro é que foi inventada no século XVI por Thomas More — Utopia é o título de uma obra escrita por esse filósofo —, porém passou a ser empregada para designar narrativas e discursos muito anteriores, como, por exemplo, a cidade ideal na República de Platão, ou o projeto arquitetônico da cidade perfeita traçada pelo geômetra e astrônomo grego Hipodamos de Mileto, que, aplicando a geometria e a astronomia ao plano urbanístico, concebeu a cidade de acordo com a harmonia cósmica, ou ainda a descrição da Idade de Ouro nos poemas dos latinos Virgílio e Ovídio.
 
O segundo diz respeito ao sentido dessa palavra. Em grego, tópos significa lugar e o prefixo “u” tende a ser empregado com significado negativo, de modo que utopia significa “não lugar” ou “lugar nenhum”. Aliás, numa carta, Thomas More enfatiza que a emprega no sentido negativo ou do “lugar nenhum”. 
 
O sentido comum que é dado para Utopia é o de projeto irrealizável. Outros autores fazem descrições de sociedades utópicas, entre os quais Francis Bacon com “A Nova Atlântida” e Tommaso Campanella em “A Cidade do Sol”. Mais tarde, já no século XIX, é a vez de Marx que cria o que designou por “socialismo utópico” que caracterizava como uma sociedade igualitária, harmoniosa e fraternal.
 
Percebemos, ao longo dos estudos e dos séculos que, estando a Utopia desfasada da realidade, esta não permite qualquer transformação verdadeira na sociedade. Precisamos dela em todo conceito de cidade, e de vida, que empregamos: a realidade pede novas Utopias!
 
Na Psicanálise de Sigmund Freud, também é possível um olhar para as Utopias. O prazer, o gozo, e a busca constante pela primeira sensação do prazer nos levam a viver permanentemente em estado de “pulsão”, isto é, em busca de novas Utopias, o irrealizável, o paraíso, o infinito – a metáfora do céu ou do mar cabe perfeitamente para o mergulho que é o contato com o inconsciente. 
 
O conceito de Utopia funciona como ferramenta conceitual para abordar o sintoma social contemporâneo. As Utopias funcionam como analisadores críticos dos ideais, esperanças e potenciais eufóricos de um determinado tempo. Não é preciso viajar muito para divagar nesta simples, porém intensa, hipótese: a vida tolera tudo, menos estagnação –  solitária falsa ideia de que deixamos de acreditar e sonhar. Perder as Utopias é como ficar sem fé. A Utopia pode ser aquele desejo, instinto de vida, de enxergar o céu na terra, ou mesmo, ter todos os anseios atendidos. 
 
Deixar de acreditar na vida é o primeiro passo para a propagação das ideias suicidas: fingir que é bela a depredação humana; julgar que tudo está perdido: na política, na vida, na religião. Imaginem se todos desistissem de tentar… Vida é isso: pulsão de vida, sempre! Há tantas bandeiras para abraçar-se em apenas uma; são tantos humanos querendo ser ouvidos; crianças não querendo ser adultos tristes. Mesmo no descanso, o que persiste é a luta pela vida. O convite a viver pode ser renovado sempre. Basta perguntar-se qual é a nova Utopia, agora!
 
Maurício dos Santos é Terapeuta e Palestrante sobre Comportamento e Educação, Psicopedagogo e Arte-Educador Contato: imprensa.mauriciosantos@hotmail.com
 
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