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Teatro: “Amorexia” mistura bizarro e humor para falar das relações humanas em um louco cabaré

Redação Lado A 13 de Fevereiro, 2016 00h34m

Na próxima semana reestréia em Curitiba no Guairinha o espetáculo Amorexia, do diretor Thadeu Peronne. A mega produção impressiona em todos os aspectos e choca por abordar temas polêmicos.
 
As relações de amor, desejo e convivências na sociedade, temas contemporâneos abordados pela peça que abusa do show de horrores e se apropria do Teatro de Vaudeville e do Surrealismo. Nada é óbvio e previsível no espetáculo que levará novos artistas convidados a cada sessão. “A montagem navega pelo estranho e bizarro mundo dos relacionamentos humanos, convidando o expectador a um (re)conhecimento das diversas arestas dos amor que invade nossas almas”, comentou o diretor Thadeu Peronne que também atua no espetáculo que interage com o público a cada momento. intenso, aprovocante, imperdível.
 
“Desejo”, “Da natureza dos peixes”, “Ferida”, “As Cegas” e trechos de “Vazio” –  são os títulos das cenas inspiradas nas obras do dramaturgo curitibano  Douglas Daronco que conduzem o espetáculo.
 
Confira a entrevista feita pelo nosso redator Lucas Panek, por Skype:
 
Lado A: Como surgiu o espetáculo do Amorexia e como ele foi amadurecendo ao longo dessas três temporadas?
A idealização desse projeto vem de bem antes de eu convidar o Marvhem, a Marcelina e a Ana Paula, que foi a primeira atriz antes da Marcelina [membros do elenco]. Esse projeto tinha outro nome e era só para montar quatro textos do Douglas Daronco, um autor erradicado aqui em Curitiba e que teve uma formação no Núcleo de Dramaturgia do SESI, por onde também passei. Então, eu comecei a dirigir alguns trabalhos dele, lá trás, e eu acabe dirigindo um espetáculo chamado Amores (Re)Partidos, que falava sobre o universo feminino, porque o Douglas escreve muito sobre a mulher e tal. 
 
Aí, eu inscrevi esse projeto na Lei Municipal de Incentivo com a proposta de uma segunda parte. Para isso, eu decidi que não ia montar uma sequencia sobre Amores (Re)Partidos, que falaria sobre o amor de forma seca, ou seja, não queria falar sobre a densidade do amor. Eu queria pôr comédia. Mas me questionei sobre quem eu poderia trazer para o elenco que agregaria esse efeito. Então, no começo eu trouxe a Ana Paula e o Marvhem, que além de ator, é um grande cantor, comediante, pesquisador da música do cabaré. Ele nos ajudou em tudo, com ideias na cenografia e na música. 
 
Já a ideia do Cabaré foi uma pira minha. Pense: o Cabaré é o único lugar onde todos nós podemos habitar de uma maneira livre. Então, primeiro surgiu a ideia que seria habitar o Cine Teatro Cabaré Amorexia e homenagear todo aquele tempo em que os cabarés estiveram em alta, mas sem trazer um aspecto datado. Aí a gente acaba celebrando muitos fantasmas do tempo dos shows, com grandes divas da década de 1920 e 1930, que romperam com o conservadorismo, dançando seminuas e tal. 
 
Para dar corpo, juntei um time de profissionais excelentes. Ou seja, o segundo ponto é fazer do espetáculo um encontro de grandes artistas (Veja a ficha técnica no final)
 
E como você e Marvhem se conheceram?
O Marvhem é meu amigo desde 1997, quando a gente fazia espetáculos de rua. A gente se conheceu e ficou muito amigo, já tivemos o Projeto Sorrisos e tal. Então, a gente é da comédia mesmo. Agora, estamos navegando na tragédia com a comédia. 
 
Por que representar o amor num espaço como o Cabaré?
Quem frequenta baladas e a noite sabe que muitas coisas acontecem naqueles espaços, nos cabarés da vida. No geral, quando você vai ver um show de drag, por exemplo, há um amor incrível no momento da transformação e das performances. Elas são e vivem aquele momento e ninguém sabe tudo o que rola por trás daquilo, o que é a vida de cada uma daquelas pessoas. 
 
Então, os textos já trazem a dor e a delícia de ser quem você é: a solidão, a dificuldade de relacionamento, o amor. E quando a gente sai pra noite beber e se divertir, a gente também sai para encontrar um amor, para ser encontrado e para se encontrar. 
 
Fora isso tudo, tem uma cena chamada “Audição”, onde vários artistas são convidados. É mais uma ideia de Cabaré, do tipo “quais são as atrações de hoje?”. Nesta temporada teremos Ranieri Gonzalez, Cleide Piasecki, Lia Comandulli, Kassandra Speltri, que canta e dança, Luan Machado, que acabou de voltar de Nova York, Penelope White, cantora de cabaré inglesa. E essas participações também questionam o ser artista. Porque a gente envelhece fazendo testes, entregando projetos para editais, pedindo para ser analisado por comissões de premios, envelhecemos pedindo espaço na sociedade. Então essa é uma cena onde os convidados farão um teste para entrar no Cabaré. 
 
Os personagens do espetáculo usam o corpo como um ato performático e expressivo. Como foi a construção deles, a relação com a androgenia e as influências?
O escritor, o Douglas, é um cara que tem uma experiência incrível com o ser humano. Então, quando você é artista, você precisa ter uma pesquisa de ser humano, primeiro para ter um leque de opções e segundo para fazer um trabalho de corpo, voz e tipos. E como ele é síndico de um edifício gigantesco, ele tem histórias inacreditáveis que envolvem o prédio e a vida pessoal dele. Nas nossas reuniões, enquanto ele falava, imediatamente o nosso repertório já foi aflorando. 
 
E é uma delícia, sendo ator, quando alguém te entrega personagens só precisam ser incorporados, que só precisam do seu corpo. E isso funcionou como uma alavanca que gera bastante identificação no público, sabe? “Ah, a minha mãe conhece essa mulher” ou “O meu pai dizia que tinha uma assim no puteiro que ele ia”. Ele é autor que adora o submundo, das drags e travestis, porque ele enxerga humanidade nessas questões. 
 
Na preparação de corpo, nós fizemos sessões de strip tease também. E nelas exploramos a nós mesmos, o despudor, a feminilidade e o ato de se expor, né? Como entregar o corpo para o outro. Então, quando a gente se juntou e trouxe o nosso repertório, fomos construindo esses corpos expressivos, que você disse. Porque uma coisa é fazer um estereótipo afetado, por exemplo, mas outra coisa é criar uma história para aquele personagem e aí falar em tom afetado. Então, a ideia é criar esse corpo revolucionário. Até já nos falaram que lembramos os Dzi Croquetts. 
 
Eu ia comentar justamente isso. Como vocês lidam com essa referência?
Claro, seria muito fácil dizer que toda a fonte de inspiração foi o Dzi Croquetts. Mas o mais engraçado é que desde aquela época em que a gente montou o primeiro espetáculo de cabaré, já não ouvíamos mais falar de Dzi Croquetts. Fui ouvir falar deles só uns dois ou três anos atrás, quando a histórias deles teve um boom por causa do filme. Já o Thadeu só foi ouvir falar agora, na segunda temporada em exibição. Acho que as fórmulas realmente são similares e é uma honra pra gente falar isso, uma vez que mostra o homem trabalhando o seu lado mulher de uma maneira tão essencial. 
 
E o público espera que, primeira coisa, seja convencido e, segunda coisa, seja transformado. E essa é a magia que acontecia nos Dzi Croquetts, que acontece também com o Amorexia. Então, é uma grande honra, mas não nos baseamos no trabalho deles. 
 
E a relação da peça com a homossexualidade?
O espetáculo tem um respeito incrível pela homossexualidade, mas nós não somos panfletários. A gente quer que as pessoas se identifiquem e não haja nenhum tipo de julgamento, a gente apenas é em cena. Agora, se o público me achou viado ou que eu sou uma bicha, não é mais comigo. Quem vai morrer com esses questionamentos são eles. 
 
O nome “Amorexia” me deixou bastante curioso. Como foi a construção desse nome?
Eu não queria continuar com “Amores (Re)Partidos”, então precisava encontrar um nome. Eu queria alguma coisa ligado a asfixia, a falta de ar. Aí o Douglas me mandou diversas sugestões até que chegamos em “Amorexia”. Pensei, amor com asfixia tem bastante a ver. Até dá para fazer a analogia o fato de você emagrecer e definhar quando você ama alguém.
 
Por exemplo, a coisa que mais me transformou na minha vida, além de ser artista, foi amar outra pessoa. Esse amor foi algo que me sufocou, também de prazer, mas foi um sufoco. Então, a Amorexia é a gota final, o limite, do que pode ser o amor mesmo. 
 
AMOREXIA
Quando? De 18 a 28 de Fevereiro (Quinta à Sábado 21:00 h e Domingos às 19h)
Onde? Teatro Guaíra – Auditório Salvador de Ferrante – Guairinha
Quanto? R$30 Inteira e R$15 + taxa de RS 6,00 Disk Ingresso
Informações: Teatro Guaíra (41) 3304 7900 , Diskingresso (041) 30150808 ou com a produção do espetáculo (041)96362133.
 
FICHA TÉCNICA
Direção, Concepção Artística e Produção Thadeu Peronne 
Textos de Douglas Daronco  
Elenco: Marvhem Hardware , Marcelina Fialho e Thadeu Peronne 
Assistente de Direção : Marvhem Hadware
Preparação Corporal e Coreografias : Inês Drumond
Criação de Sonoplastia: Ricardo Janotto 
Cenário: Aorelio Domingues 
Figurinos : Paulinho Maia
Maquiagem : Marcelino de Miranda 
Iluminação: Rodrigo Ziolkowski
Divulgação : Thadeu Peronne 
Arte do Material Gráfico e Designer : Márcia Széliga 
Contra-regra : Gladson Targa 
Fotógrafo oficial : David D’Visant
 
Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

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A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa


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