Temos uma imagem nossa, que criamos de nós mesmos, mas mostramos outra melhorada para o mundo, principalmente nas redes sociais. Muita gente é elogiada por ter “naturalidade” frente às câmeras, ou por ser simpática, mas são elas mesmo ali ou o alter ego que criaram para se mostrar ao mundo? Conhecemos pouco uns aos outros, falamos poucos dos nossos sentimentos. Não conhecemos o outro e muitas vezes nem a nós mesmos.
Nesta busca desenfreada pelo eu, acabamos sendo egoístas. Ou o Eu virou assunto para quando não temos mais nada para falar ou postar. Viver virou compartilhar aquilo que vale a pena ser mostrado e questões existenciais são coisa de gente deprimida. Fazemos tudo para os outros, mas ao mesmo tempo para nós, mas não para o nosso crescimento pessoal em si mas para o crescimento da nossa popularidade ou para auto afirmação da imagem que criamos. Fugimos ou perdemos o foco com facilidade naquilo que supostamente nos é importante.
E nos relacionamentos, pouco conhecemos o outro. A carapaça dura e a cultura que se criou em torno do “agora e já” diz que não podemos falar do passado, não devemos planejar o futuro com o outro, não devemos mostrar nossos sentimentos. Não devemos demonstrar a nossa ansiedade e outras fraquezas. Devemos criar e reforçar a ilusão, para o outro e para nós mesmos de que somos o que ele vê e que se quiser ok, senão tem mais gente querendo, o que nem sempre é verdade. Devemos mostrar felicidade e sucesso. Compromissos, segundo essa teoria, somente entramos nos que nos beneficiam de imediato. Chega uma hora porém que tudo vale a pena, pois era o que tinha para hoje… E se não deu certo, é porque não era para ser. O fato de nem ter havido qualquer esforço não conta, você estava tempo demais ocupado cuidando das suas redes sociais.
Diz o filósofo polonês: “O amor é mais falado do que vivido. Vivemos um tempo de secreta angústia. Filosoficamente a angústia é o sentimento do nada. O corpo se inquieta e a alma sufoca. Há uma vertigem permeando as relações, tudo se torna vacilante, tudo pode ser deletado: o amor e os amigos… Estamos todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo”.
E somos definidos pela quantidade de seguidores, de bens, de amigos, pelo nosso carro, pelas nossas roupas, festas e viagens… mas quem de fato somos? Somos produto de nossas próprias ilusões reafirmadas por imagens captadas pelo nosso celular de última geração? A certeza que temos é que nascemos livres e nos prendemos, nos prendem, enfim, estamos amarrados a expectativas próprias e alheias. Quem ousa dizer a verdade ou o que pensa corre o risco de ser rotulado de intolerante ou invejoso. “As inimigas” nem sempre são inimigas, elas podem ser um alerta.
O medo de não pertencer, o medo da solidão, o medo de ficar sozinho no quarto escuro é tanto que as pessoas preferem colocar tudo em risco ou mesmo viverem o hoje como se o amanhã não pudesse ser mudado. As pessoas não se unem mais para o bem, elas seguem a corrente e se unem principalmente quando os interesses são comuns, muitas vezes atingidos de forma não ideal, e precisam de reforço, ou para dividir um peso. Ou seja, querem repartir a culpa ou a conta. O interesse comum nunca é um terceiro para muitas pessoas.
E quando tentamos fazer diferente, o sistema nos manda um recado claro no trabalho, no amor, na família. Nos iludimos com pessoas que nos machucam e mostram que pode ser que somos antiquados demais par ao mundo de hoje ou pertencemos a uma raça em extinção. A gente se martiriza e se chama de burro, por ter acreditado que desta vez seria diferente e poderia confiar no outro. Talvez não seja inocência ou masoquismo, talvez seja um pouco de esperança que nos move a nos arriscar, talvez não seja o sistema, talvez vivamos mesmo em uma sala escura e podemos apenas ver as imagens projetadas. Não se molde, seja você.
O Mito da Caverna, de Platão, texto muito usado nas faculdades de comunicação social, fala sobre isso. Um grupo de prisioneiros acorrentados desde o nascimento em uma caverna tem como noção de mundo as imagens das sombras projetadas por uma fogueira. Um deles ao sair poderia votar e descrever o mundo lá fora que ele seria motivo de piada entre os colegas. Condicionados com as sombras, eles não conseguiriam ver o mundo real e a cores que o outro amigo experimentou.
E assim somos nós em nossos grupos e vidas. Temos as nossas sombras internas e as externas. O real e o imaginário, virtual e natural, se confundem. E tudo isso é tão complexo que podemos nos tornar avatares de nós mesmos com muita facilidade.