O Morro Dois Irmãos é testemunha:
– Oi, você conhece esse garoto aqui? (Foto enviada)
– Não, por quê?
– Você sabia que ele está passando HIV pra geral?
– Como assim? Deixa eu entender, ele te passou HIV?
– Não, claro que não!
– E como você sabe que ele é soropositivo e está contaminando todo mundo?
– Um colega me contou…
‘Um colega me contou’, fofoca, disse me disse, comentários maldosos e desgosto com a felicidade alheia só tem dois significados: falta de amor, ou inveja.
Agora escutem mais essa, parece inacreditável.
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Um bando de saradões está na praia de Ipanema comentando sobre a última festa e um deles (o menos beneficiado pela beleza), mostra um vídeo em que pegou “no flagra” dois rapazes tentando fazer bebê em plena pista de dança – ambos completamente fora de si, óbvio.
Os queridinhos do Rio – como se nunca tivessem dado um rolê nos banheiros da vida – dão risadas, acham o máximo e pedem que encaminhem o malfeito por WhatsApp, que vai parar no celular da barraca ao lado, que chega ao Arpoador, que volta até o Coqueirão, respinga em Mykonos, rebate na Avenida Paulista e termina na timeline do Facebook fazendo o dia das pessoas mais infelizes da Terra valerem a pena porque, acreditem, muita gente só se sente maior tentando diminuir o próximo. Até que um dia chega a vez deles, o famoso bate e volta que o próprio universo se encarrega de ajeitar. Daí é glup glup: a fofoqueira da praia se afoga nas próprias palavras.
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O que há de errado com os garotos de Ipanema? Em que momento um lugar tão democrático virou palco de guerra?
Esses exemplos de comportamento primitivo vêm de uma estrutura familiar falida da nossa geração. Crianças mimadas que cresceram adestradas por elogios em excesso, ouvindo o tempo todo que eram especiais e recebendo estrelinhas na testa quando faziam coisas que não passavam da própria obrigação. Jovens que tiveram tudo de mão beijada (o que não significa que tinham dinheiro), e tornaram-se adultos narcisistas, sem foco, sem planos de vida a longo prazo; pessoas amargas prontas para atacar o vizinho que tem a grama mais verde, a barriga mais sarada, o namorado mais bonito – porque não aprenderam a perder, não vivenciaram o fato de que também há felicidade para os que chegam em segundo lugar.
Hoje, o garoto de Ipanema quer apenas causar impacto. Está na praia se sentindo especial, a majestade, anda pelo calçadão com o nariz empinado e olha as pessoas ao seu redor de cima pra baixo. Trata tudo e todos como meros figurantes, como parte de um cenário onde ele é o personagem principal. A questão é que todos pensam e agem da mesma forma. E o que acontece? Guerra de egos, falta de empatia e um falatório sem sentido que agrega zero valores à nossa vida.
Pouco importa o que o outro faz, ou deixa de fazer. O que não falta nesse mundo é gente desinteressante se comportando como DIVA (Departamento de Investigação da Vida Alheia). Gente que fica de prontidão esperando o nosso primeiro deslize para propagar a mágoa e o ódio que existe dentro de si. Fofocam aleatoriamente para compensar o fracasso, a falta de novidade, para esconderem o monstro que são através de palavras indigestas, roupas de grife, ou de corpos transformados pelos venenos da moda.
A Ipanema de antes era um refúgio para o mundo cruel das pessoas que se sentiam sufocadas por serem gays; era um paraíso com um pôr do sol sem filtro, rolava pegação sim, mas também rolavam casamentos, firmavam-se amizades verdadeiras; biscoito Globo não engordava e se engordasse ninguém morria por isso, dava para ter uma barriguinha sem se sentir um alienígena. E nas areias, menos estupidez e mais alegria.
Não dá para voltar no tempo, mas dá pra ser uma pessoa melhor!
Bruno de Abreu Rangel
brunorangelbrazil@hotmail.com
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