Homofobia na Argentina: Parentes pedem Justiça no caso Octavio Romero

No domingo, na XV Parada do Orgulho Gay de São Paulo, uma faixa chamava a atenção na manifestação. A mensagem pedia Justiça pela morte do marinheiro argentino Octavio Romero (à esquerda), 33, e era empunhada pela madrasta brasileira de Gabriel Gersbach (de laranja), com quem o fuzileiro iria se casar em Buenos Aires no fim do ano. Gabriel e Octavio estavam juntos há 12 anos. Assumido gay há pouco tempo, o argentino desapareceu misteriosamente de seu apartamento no Centro de Buenos Aires no dia 11 de Junho último, deixando um casaco sobre a cama, dinheiro à vista, a tevê e luzes ligadas. Seu corpo foi encontrado no dia 17 de junho no Rio De La Plata, com golpes no rosto e pelado.

Ele seria o primeiro oficial argentino a casar com uma pessoa do mesmo sexo, o que aumentam as suspeitas de crime de ódio sobre o caso. Após manifestar que iria se unir ao seu companheiro, o banheiro do trabalho foi pichado com ofensas homofóbicas e ele foi questionado se usaria o uniforme da Guarda Costeira durante a cerimônia. Não estava em seus planos, mesmo assim, na internet, mensagens de ofensa se multiplicava mas eram ignoradas, Octavio não tinha medo e desprezava o que considerava atitudes de pessoas ignorantes. Próximo ao local onde seu corpo foi encontrado, a polícia achou um misterioso buquê de flores vermelhas. Naquela noite em que desapareceu, Octavio deveria se encontrar com amigos. Despediu-se minutos antes de seu companheiro que é taxista e saía para trabalhar. A bebida que ele levaria ao jantar de aniversário na casa de uma amiga ainda estava na geladeira no dia seguinte e ele nunca chegou à festa. Seu sumiço e o desespero por seu paradeiro até encontrarem seu corpo mobilizou amigos e a comunidade gay local que agora pedem empenho das autoridades para esclarecer o crime.

Como nada foi levado do apartamento de Romero, a polícia acredita que ele saiu para acompanhar alguém ou respondeu uma chamada de emergência. Vizinhos também não viram nada. A polícia também suspeita que possa ser uma mensagem de mafiosos para a Prefeitura, onde Romero era sub oficial e trabalhou por 15 anos, os últimos no setor de liberação de embarcações. 

Romero é descrito por amigos e parentes como uma pessoa encantadora. “Não posso entender que alguém que conhecia ele seria capaz de fazer uma coisa dessas”, afirmou para a Lado A, por telefone, o companheiro de Octavio que está contando com o apoio da família para superar a perda. “Eu estou sofrendo a dor da perda. Quando ele não aparece ou não liga… nós tínhamos uma relação muito carinhosa, nos falávamos a todo o momento”, conta Gabriel que está sentindo em sua saúde todo o estresse da perda e a luta por Justiça.

O noivo se culpa por não ter levado o amado ao compromisso e comentou o dia fatídico do desaparecimento do noivo: “Ele desaparece e no dia seguinte eu acordo e vou na delegacia denunciar o desaparecimento, encontro com os chefes deles… A morte pegou forte em amigos e famílias”. Gabriel e Octavio haviam acabado de retornar da Europa, onde visitaram parentes. Eles viviam uma ótima fase da relação e planejavam o casamento que seria em Dezembro. “Minha casa está toda com caixas, fico separando coisas. A Justiça está trabalhando, a cada dois dias estou indo lá acompanhar”, conta o taxista sobre sua rotina desde o crime. A família se dividiu para ajudar Gabriel que não lê os jornais para tentar se afastar da tragédia que abalou sua vida. Ao ser perguntado sobre detalhes na investigação, ele consulta alguém ao lado. Seus irmãos quem atendem os telefones de contato informados no site octavioromero.net, criado para que as pessoas que tenham informações sobre o caso possam ajudar. Gabriel está desolado, mas diz que acredita na Justiça: “A gente tem fé em Deus e na Justiça de alguma forma”, falou o “viúvo” com a voz fraca. Ao falar de Octavio, ele se anima e fala com carinho do parceiro de longa data morto, às vezes usando o presente, como se ele ainda estivesse vivo. “Ele é… ele era uma pessoa inteligente, tinha uma carreira que foi interrompida. Três títulos, ia terminar Relações Internacionais agora”, relembra Gersbach o amado que era fluente em várias línguas, entre elas o português. Ele concorda que o fato do corpo ter sido encontrado sem as roupas e com golpes no rosto seja um indicativo de homofobia na morte de Octavio. Ele diz que não pode acusar ninguém mas que o companheiro era forte, treinava remo e ia a cademia, e acredita que dificilmente o crime foi cometido por apenas uma pessoa.

Octavio Romero tinha um último pedido, revelado por um irmão a um jornal local: queria ser cremado e ter suas cinzas jogadas na Terra do Fogo, extremo Sul do país. A família preferiu enterrar o corpo na sua cidade natal, Curuzú Cuatiá, quem sabe, pelo menos, até que o crime seja esclarecido. A autópsia do corpo ainda não foi concluída.

Redação Lado A :A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa