Saiba o que é a trans despatologização e o porquê desta bandeira

No ano passado, internacionalmente, defendeu-se a saída da transexualidade e travestismo do rol de doenças do Código Internacional de Doenças (CID) e do DSM – Manual Diagnóstico e Estatístico das Doenças Mentais, da Associação Americana de Psiquiatria. Assim como a homossexualidade no passado, a disforia de gênero ou transtorno de identidade de gênero, termos técnicos para a inadequação do corpo e mente na questão do gênero genital de nascimento e o da identidade de gênero – auto percepção, é considerada um transtorno mental. 
 
Lá fora, onde as transexuais não contam com atendimento de saúde gratuito e tem fácil acesso ao crédito para realizar cirurgias de readequação genital, a bandeira da retirada do rol de doenças ganhou força facilmente. Por aqui o tema é acadêmico, e as trans (travestis e transexuais) não chegaram a um consenso dentro da militância, pois não tem garantias de que serão atendidas pelo SUS em suas demandas quando não forem mais consideradas “doentes”. Em 1997, o Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou a resolução 1.482/97, autorizando as chamadas “cirurgias de transgenitalização” para o tratamento gratuito de transexuais no Brasil, com base exatamente no CID.
 
Se no movimento brasileiro ainda não há uma opinião ou bandeira, dentro no Ministério da Saúde e nas universidades há o desejo de se despatologizar o transtorno de identidade de gênero. Em breve, o Ministério da Saúde, que atualmente promove com lentidão as cirurgias de “mudança de sexo”, como são conhecidas popularmente, se manifestará sobre a questão. Ninguém concorda com a tipificação desta questão de gênero como doença.  E há quem defenda ainda que a divisão do gênero como masculino e feminino é reducionista e limita a diversidade de gêneros. Em países como a Austrália, por exemplo, as pessoas não são obrigadas a preencher a qual dos gêneros faz parte, havendo uma opção “sem gênero definido”.
A campanha internacional deverá surgir efeito em 2014, quando será publicado o novo CID – Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, da Organização Mundial de Saúde. Até lá, a questão deve ser bem debatida e haver uma garantia dos direitos já conquistados no Brasil. 
“Retirar o rótulo de “doente mental” das pessoas trans, signicará devolver a elas uma potência perdida na idéia de que são “seres desviantes”, proporcionando uma abertura para que possam se apropriar de suas identidades e desenvolver sua autonomia” defendeu o Conselho Federal de Psicologia em manifesto apoiando a trans despatologização.
 
Para a militante Carla Amaral, do Transgrupo Marcela Prado, o tema não é muito debatido no movimento mas deverá ganhar destaque este ano. A maioria das transexuais, abandonadas por suas famílias, sem escolaridade e vivendo na marginalidade, não tem condições de pagar pela cirurgia de readequação genital, e isso pesa na decisão de perder a assistência do Sistema Único de Saúde no processo transexualizador. Outra questão é o preconceito enfrentado por transexuais e travestis é o mais alto em toda a sociedade, o que impacta em sua saúde diretamente. A maior parte delas, exiladas na prostituição em busca do sonho de poder realizar a cirurgia e transformar-se externamente no que sentem ser por dentro  e mostrando abertamente 24h ser trans, encontram uma expectativa de vida reduzida pela metade da média de uma pessoa heterossexual. Apenas este ano, 27 travestis e transexuais foram assassinadas no Brasil. Uma média de uma morte a cada 4 dias.
 
Para a atriz, modelo e ativista Maite Schneider é preciso defender a bandeira.”Está escrito na Constituição, que é direito, uma questão de saúde pública. Uma questão é doença e outra é ser um problema de saúde e devemos contar com a responsabilidade do Estado”. Maite compara com a gravidez, que não é uma doença mas conta com o respaldo do SUS e de programas especiais. “Para mim é simples. O índice de suicídio ou surtos por causa da questão genital é grande. Não podemos equiparar. Saúde tem que ser atendida como prioridade para a Vida”, defende ela que fez a readequação genital em 2007, depois de se submeter a retirada de seus testículos no mercado negro, no Paraguai, por não aguentar esperar pela cirurgia.
 

Redação Lado A :A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa