Na sexta-feira, 28 de junho, Dia Internacional do Orgulho Gay, a presidente Dilma Rousseff recebeu no Palácio do Planalto representantes do movimento gay. O dia era especial pois marcou os 44 anos da Revolta de Stonewall, em Nova York, dia histórico para o movimento gay moderno. A presidenta recebeu carta e demandas da comunidade gay e pediu mais dados sobre a violência homofóbica no país. Ela se comprometeu a trabalhar contra a discriminação e preconceito em seu governo.
Participaram da reunião que durou mais de uma hora 15 representantes de diferentes entidades nacionais LGBT e ainda as ministras dos Direitos Humanos, Maria do Rosário e Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para as Mulheres, e o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho. Dilma posou ainda com o grupo e a bandeira do orgulho gay.
Confira na íntegra a carta entregue à presidente:
CARTA PÚBLICA DAS ENTIDADES DO MOVIMENTO DE LÉSBICAS, GAYS, BISSEXUAIS, TRAVESTIS E TRANSEXUAIS DO BRASIL À PRESIDENTA DILMA ROUSSEFF
O Brasil experimenta o período democrático mais longo da nossa história. Este momento vem se consolidando por meio de nossas instituições democráticas e do povo brasileiro, que nos últimos dias tem saído às ruas mostrando seus principais anseios e reivindicações.
O movimento LGBT compôs todas as mobilizações e manifestações recentes. Sempre estivemos nas ruas. As Paradas e Marchas Nacionais contra a Homo-lesbo-transfobia simbolizam este nosso compromisso histórico e constante com processos de luta que são elementos fundamentais para o fortalecimento da democracia e do Estado Laico.
Reafirmamos, enquanto movimento organizado, nas ruas, nossas reivindicações históricas de reconhecimento de direitos e cidadania plena, contribuindo para que milhões de brasileiros/as sintam-se parte do nosso Estado democrático, rejeitando, assim, qualquer tentativa de golpe.
É extremamente simbólico que a Presidenta da República receba o movimento LGBT no dia 28 de Junho. Foi nesta data que em Nova York (EUA) ocorreu a conhecida Revolta de Stonewall. Neste episódio as pessoas LGBT enfrentaram a dura repressão policial existente na época contra a livre expressão de suas orientações sexuais e identidades de gênero. Desde então, esta data tornou-se um dos principais marcos históricos para a organização do movimento LGB internacional na modernidade, sendo comemorada como o dia de orgulho e promoção da cidadania desta população.
A partir da década de 90, com a visibilidade expressiva do Movimento LGBT, o Brasil passou a desenhar políticas para a nossa população. Se no período neoliberal estávamos quase que restritos às políticas no campo da saúde, ajudando a consolidar importantes e históricas ações de prevenção a DST/AIDS no país, foi a partir dos Governos Democráticos Populares que passamos a avançar para a construção efetiva da Cidadania LGBT.
O lançamento do Programa Brasil Sem Homofobia (2004), a realização das Conferências Nacionais LGBT (2008;2011), o lançamento do I Plano Nacional LGBT (2009), a criação da Coordenação-Geral LGBT (2009) na Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a instalação do Conselho Nacional LGBT (2010) e o lançamento recente do Sistema Nacional de Promoção de Direitos e Enfrentamento à Violência contra LGBT (2013), representam, na contemporaneidade, os grandes marcos históricos institucionais destes importantes avanços.
Entretanto, apesar do Brasil estar consolidando um processo histórico de inclusão social, com a melhoria da condição socioeconômica da população, combate à fome e à miséria absoluta, ainda somos apontados, internacionalmente, como um dos países que mais comete crime por homofobia no mundo. Mostrando uma faceta distinta de como o país é conhecido pelo mundo afora.
Os dados oficiais registrados pela Ouvidoria da Secretaria de Direitos Humanos e apresentados ao Conselho Nacional LGBT mostram índices alarmantes que configuram as diferentes formas de discriminações e violações contra a população LGBT no Brasil, correspondendo a cerca de 14 pessoas que são vítimas de violências homo-lesbo-transfóbicas por dia, num total de 9.982 violações envolvendo 4.851 vítimas e 4.784 suspeitos, no último ano, dentre as quais 310 são homicídios, caracterizados, em sua grande maioria, com requintas de ódio e crueldade.
Esses números oficiais retratam a violência física e simbólica que demarcam o cotidiano da população LGBT. A pesquisa “Preconceito e Discriminação no Ambiente Escolar” realizada pela Fundação Instituto de Pesquisa Econômica, em 2009, aponta que 87,3% da comunidade escolar entrevistada, tem preconceito em relação à orientação sexual. De acordo com a Fundação Perseu Abramo, no mesmo ano, na pesquisa “Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil: intolerância e respeito às diferenças sexuais”, 92% da população reconhece a existência do preconceito contra LGBT, sendo identificado que esse percentual é cinco vezes maior que o preconceito contra negros e idosos detectado pela Fundação.
Os registros do Disque 100 e das pesquisas citadas representam a expressão da cultura sexista, machista e racista que permeia as relações na sociedade brasileira e que encontra ecos no fundamentalismo religioso. O PDC 234 apresentado pelo Deputado Federal João Campos (PSBD-GO) que é conhecido publicamente como o “Projeto da Cura Gay” aprovado na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, assim como a PEC 99/11 apresentada pelo mesmo Deputado, explicitam essa cultura.
Neste sentido, as entidades LGBT abaixo relacionadas, priorizam as seguintes demandas à Presidência da República:
2) Lançamento do 2º Plano Nacional de Promoção de Direitos e Enfrentamento à Violência contra LGBT, contemplando a transversalidade dos seus eixos: saúde, educação, segurança pública, trabalho e renda, cultura e habitação;
3) Priorização orçamentária para as políticas públicas LGBT, com programa específico nos instrumentos do Orçamento Federal (PPA, LOA e LDO), com o objetivo de efetivar o Sistema Nacional LGBT, consolidar o funcionamento da Coordenação-Geral LGBT e do Conselho Nacional LGBT, e de ser uma resposta concreta do Estado e do Governo aos altos índices de violência homo-lesbo-transfóbica no país;
4) Garantia dos avanços conquistados na política de saúde, a exemplo do SPE (Saúde e Prevenção nas Escolas), do Plano de Enfrentamento da Feminização da AIDS e do Plano de Saúde Integral LGBT, bem como a apresentação de respostas concretas do Governo às violências contra a livre expressão da orientação sexual e identidade de gênero detectadas no ambiente escolar;
5) Mobilização da base do Governo para a rejeição do PDC 234 (Projeto da Cura Gay) e da PEC 99 que, para nós, fere diretamente o princípio da laicidade do Estado.
Certos de contarmos com o compromisso deste Governo, agradecemos desde já a atenção.
Assinam,
ABEH – Associação Brasileira de Estudos da Homocultura;
ABL – Articulação Brasileira de Lésbicas;
ANTRA – Articulação Nacional de Travestis e Transexuais;
ARTGAY – Articulação Brasileira de Gays;
LBL – Liga Brasileira de Lésbicas
CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação;