Andréia Verão: A vereadora travesti que não leu mas que de boba não tem nada

Ela ficou famosa pelos motivos errados, apesar do bafo ter acontecido no ano passado, o assunto ganhou destaque novamente, coisas da internet.

A ex coletora de lixo de Carapicuíba, uma das regiões mais pobres e violentas da Grande São Paulo, Andréia Verão, 43, ficou famosa nacionalmente ao gaguejar e não ler um requerimento no ano passado na Câmara da cidade, onde é vereadora. Eleita com mais de 4 mil votos, Andréia é vereadora pelo PHS, Partido Humanista da Solidariedade.

A cena parece clara: A vereadora não sabe ler o próprio requerimento. Mas os fatos são diferentes. Vestida de terno e gravata, pois não é autorizada a usar vestimentas femininas no trabalho, ela é surpreendida por um pedido de requerimento feito por sua assessoria em seu nome. Era o secretário da mesa da Câmara quem deveria ler o requerimento, mas sabendo das dificuldades da vereadora, o presidente da mesa, Abraão Junior, pede para a travesti ler a pauta do dia 03 de abril de 2013. Andréia, que estudou até a terceira série do primário, sabe ler, como mostrou em sessão posterior, devagar e com dificuldade, mas ali estava armada uma verdadeira arapuca para a vereadora e ela estava muito nervosa.

O tal requerimento era um pedido para ter acesso a todos os contratos e licitações da Câmara, com objetivo de investigar e reincidir contratos fraudulentos, como manifestaram seus assessores anteriormente. Uma medida nobre organizada por sua assessoria mas que colocaria a vereadora no meio de um vespeiro com os outros 16 vereadores, sobretudo com o presidente da casa. A assessoria de Andréia cobrava da vereadora por cargos e benefícios e não escondiam que sustentaram a campanha e a política antes de ela assumir o mandato. Cobraravam ainda que o partido é o único a não ter uma secretaria na Prefeitura.

Entre a cruz e a espada, a vereadora não leu. Na seção seguinte, ela demite toda a sua assessoria, lendo o pedido de exoneração, bem bonita. Os ex assessores prometem entrar com recurso no partido para tomar a vaga da vereadora, que pela lei é do partido e não de Andréia. A situação política se resolveu mas a discussão ganha fôlego com as imagens na internet este ano.

Vinda de origem humilde, Andréia chegou com muito apelo e carisma a um cargo importante. De um lado a militância homossexual acusa a vereadora (que se elegeu com o voto e força dos amigos e povo da cidade e não recebeu apoio algum de gays militantes) de mal representar a classe, do outro, uma intolerante bancada conservadora religiosa engole a vereadora eleita, pero no mucho. Pessoas que nem de Carapicuíba são evocam que a vereadora não deveria assumir o cargo sendo analfabeta, pois ganha 12 mil reais, dinheiro do povo, uma vergonha.

Andréia representa bem a maioria analfabeta, semianalfabeta e analfabeta funcional do país. São milhões de pessoas, algumas até com nível superior completo, que tem dificuldades de entender o que está escrito. Negra e travesti, já carrega estigmas suficientes. Representa o brasileiro que sobrevive com o que tem, que busca uma oportunidade de melhorar de vida em um país onde a lei do mais esperto ainda prevalece. Ficam claras duas coisas: cada um tem o representante que merece e que a vereadora pode ter até problemas na hora da leitura mas ela é louca de esperta. Mas é injusto, analfabeto ela não é, já que a lei diz que qualquer um que sabe escrever o próprio nome é alfabetizado. E viva o Brasil.

 

Nota do editor: O texto foi escrito esta semana e vimos depois que era um assunto do ano anterior e foi guardado, mas como o assunto insiste na internet, publicamos.

Redação Lado A :A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa