O tradicional teatro da Paixão de Cristo de Casa Amarela, bairro de Recife, foi motivo de preconceito e transfobia durante sua preparação neste mês de janeiro. A encenação acontece há 17 anos e dessa vez, segundo um dos organizadores do evento, pessoas trans foram impedidas de participar.
As apresentações da Paixão de Cristo estão previstas para abril de 2019, mas os preparativos e ensaios já começaram. Inicialmente, o fundador do projeto Fábrica – Fazendo Arte, Genivaldo Francisco, foi convidado para a organização do teatro. Sua linha de trabalho abrange levar a arte para pessoas em situação de vulnerabilidade social. A Fábrica promove a inclusão através da arte e sugeriu a participação de pessoas trans na encenação. A ideia era fazer uma parceria com a Articulação e Movimento para Travestis e Transexuais de Pernambuco (Amotrans) para realizar a inclusão de pessoas trans no elenco.
De acordo com Genivaldo, o objetivo de seu trabalho na encenação da Paixão de Cristo era diversificar o elenco. No entanto, a direção da Paixão de Cristo informou que as transexuais não poderiam participar, a não ser em cenas de prostituição. A justificativa foi a de que o Arcebispo de Olinda e Recife, que assiste anualmente à peça, poderia não gostar de ver transexuais no elenco. Além disso, alegaram que isso traria problemas para a direção do espetáculo junto à Cúpula da Igreja Católica.
A transexual Gigi Abagagerry, de 34 anos, confirmou que o espetáculo só aceita transexuais em cenas ligadas à promiscuidade. Como uma peça religiosa, tais cenas são interpretadas de forma moralista, mostrando à comunidade o que a Igreja desaprova. Abagagerry contou ainda que transexuais já participaram da peça, mas em cenas sexuais como o bacanal de Herodes.
Repúdio
Ainda com relação às trans, Genivaldo disse que foi questionado pela produção sobre a participação delas. Ele contou que até mesmo teria sido proibido de divulgar que essas pessoas participariam da peça. O representando da Fábrica informou ainda que foi impedida de associar a logo da Amotrans ao espetáculo.
Em repúdio à proibição, a Amotrans publicou uma nota nas redes sociais. A organização se declarou solidária às transexuais que se retiraram. Com relação à organização, a entidade também demonstrou repúdio.
A entidade citou o nome de José Muniz da Silva Moura, um dos responsáveis pela produção. Em contrapartida às acusações, Moura disse que não excluiu as transexuais do espetáculo. Em sua defesa, ele explicou que apenas questionou Genivaldo sobre onde encaixaria esse pessoal na peça. De acordo com Moura, suas declarações foram no sentido de justamente escolher outros papéis para essas pessoas interpretarem. Ele disse que todos podem participar e interpretar o personagem que desejarem. No entanto, Genivaldo e o restante do grupo não estão mais interessados em participar do evento.
A Fábrica – Fazendo Arte também publicou uma nota de repúdio reafirmando que todo o seu grupo artístico repudia a censura. O comunicado cita ainda as estatísticas de violência e discriminação contra travestis e transexuais. A instituição considerou a ação como “preconceituosa, desumana e medíocre”.