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Não somos Verônica, mas poderíamos ser…

Redação Lado A 16 de Abril, 2015 17h16m

Negra, travesti e prostituta. Não é fácil defender Verônica Bolina, 25, presa depois de uma agressão a uma vizinha idosa na última sexta-feira. Ao ser transferida de cela no distrito policial no domingo, ela arrancou parte da orelha de um dos carcereiros. Apareceu em seguida espancada, desfigurada, sem os cabelos, com seios à mostra, em fotos chocantes divulgadas na internet. Qual crime ela cometeu e foi julgada tão rápido para ter seus direitos negados?
 
Uma discussão ou agressão resultaria em um indiciamento por lesão corporal. Não seria detida ou presa, mas ela confrontou as autoridades policiais, caso contrário responderia em liberdade e não iria parar nem na cela do distrito policial. Mesmo assim, se fosse condenada pela Justiça, pagaria cesta básica ou multa. Mesmo se presa por algo mais grave, como a agressão ao policial, teria direito a não ter os cabelos cortados, a uma cela em que estivesse em segurança, como mandam as diretrizes carcerárias de São Paulo. Em um mundo onde policiais fazem suas leis, ela teria “provocado”. O mais grotesco foi um vídeo onde ela assume que “estava possuída” e que os policiais não tiveram culpa, foi “contida” apenas, relata ela no vídeo gravado por quem deveria prestar assistência a ela.
 
Sim, poderia ser você que por algum motivo pararia em uma delegacia ou fosse  abordado em uma batida na rua e te jogassem em uma cela. Por algum motivo, você seria tratado com todo o “peso” da lei, que na verdade é o abuso policial quando eles pensam que alguém os desrespeitou ou quanto a pessoa é um estorvo para a sociedade, a qual se julgam paladino. Se reagir, é pior. Se reagiu, será obrigado a confessar a própria culpa, de ter sido espancado e humilhado.
 
Mas a coordenadora de Políticas para a Diversidade Sexual do Estado de São Paulo, Heloísa Alves, declarar que Verônica estava em segurança, depois de visitar a ela na cadeia foi o maior absurdo. Ela ainda espalhou um áudio onde a vítima da violência policial assume a culpa de ter reagido e nega ter sofrido tortura. A coordenadora ainda pede que a versão da própria Verônica elucida o caso e que foi uma situação que ela mesma “provocou”. Em partes da gravação é possível ouvir a própria coordenadora ditando as falas de Verônica que diz que foi uma “reação” dos policiais a sua má conduta.
 
A clara manipulação da situação pelo Estado de São Paulo para tentar mostrar que não houve excesso ou tortura é uma vergonha. Está claro que houve sim imperícia desde o primeiro atendimento. E assim acontece em todo o país. A travesti pobre negra e prostituta foi julgada antes mesmo de ter seus direitos lidos… Os mesmos direitos de todos os cidadãos, que são negados desde o primeiro momento.
Não precisa ser gênio para saber que Verônica foi ameaçada de todas as formas ainda enquanto era espancada. Que ela achou que ia morrer. Que os policiais mostraram a ela que foram “bondosos” em não inventar a sua morte… Verônica só quer viver…
 
 
Ouça os áudios:
 

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A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa


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