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Walt Whitman o poeta do amanhã

Redação Lado A 22 de Agosto, 2006 18h59m

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Nascido em 1819 em West Hills, Long Island, Walt Whitman foi precursor dos versos livres e da abordagem de temas sociais, do erotismo, de temas polêmicos, da guerra, do capitalismo, da escravidão, da liberdade sexual, da literatura popular. Não à toa, é considerado o maior poeta norte-americano, senão do mundo.


Em 1855, aos 35 anos, após a morte de seu pai, publicou a primeira edição do livro ‘Leaves of Glass’, Folhas de Relva, uma coletânea de poemas que seria alterada constantemente pelo autor e viraria a sua antologia principal – ao total foram oito reedições. Thomas Eakins, pintor, amigo e diretor da Escola de artes da Pensilvânia, colocou em telas os poemas de Whitman, acabou perdendo seu emprego, assim como Whitman perdeu o seu na Capital. Eles compartilhavam uma visão real para seus trabalhos. Ambos foram vítimas do preconceito por assumirem em suas obras a sua sexualidade. Morreram sem reconhecimento mas a história os consagrou.


A estrofe 11 do poema “Canção de Mim”, que abre a  segunda publicação de Folhas de Relva,  retrata “vinte e oito jovens banhando-se na praia”, foi sem dúvida uma das mais polêmicas. O texto Calamus é o mais referenciado pelo público homossexual. O quadro ‘The Swimmers’, de Eakins, ilustra o encontro dos artistas.


Whitman estava interessado em escrever sobre e para o homem comum. Não buscava soluções metafísicas ou filosóficas. Queria denunciar o que via, relatar, passar os sentimentos humanos. Tudo em versos livres, sem heróis, ousou falar de si mesmo, falar de suas inquietações. Cantou à América, à Nova York, metrópole onde cresceu.


Aos 14 anos, mudou com a família para Nova York. No Brooklyn, foi tipografista, impressor, professor e jornalista. Passou por Nova Orleans, como jornalista e regressou ao Brooklyn no fim da década de 40, onde abriu uma papelaria e uma tipografia. Bancou a primeira edição de seu livro em 1955. Existe uma lenda de que ele apenas emprestou o maquinário e montou toda a tipografia dos 11 poemas e do prefácio. “Leaves of Grass” saiu sem o nome do autor e recebeu poucas menções favoráveis de intelectuais da época, as boas foram adicionadas à segunda edição.


Era um ótimo marketeiro, incluiu na segunda edição a “canção de mim mesmo”.  Diz-se que a terceira edição foi pirateada, em 1855, com certeza uma das primeiras obras a sofrerem deste problema. “Drum-Taps”, “Democratic Vistas” e “Specimen Days and Collect”, “November Boughs” e “Complete Poems and Prose of Walt Whitman” são outras obras do autor.


Em 1872 estava na Europa, no ano seguinte, sofreu uma paralisia facial. Logo depois sua mãe falaceu e o escritor deixou Washington para morar em Camden, New Jersey, com seu irmão George. Perseguido por juizes da época, atrasou alguns projetos seus. Viveu de ajuda de amigos e admiradores, sobretudo os europeus, e em 1884, comprou uma casa na mesma cidade. Vítima de outra no final da década de 80 e morreu em 26 de Março de 1892.


No final do século passado, Whitman foi resgatado pelo movimento gay como patrono. As suas poesias foram citadas no filme ‘Sociedade dos Poetas Mortos’, que reacendeu o interesse do grande público pelo autor. Em 2004, a Big Apple comemorou 150 anos da publicação de sua obra prima. Influenciou Oscar Wilde, Van Gogh, Paulo Leminski e toda a história.


:::::::::::::::::::::: Alguns Poemas de Whitman::::::::::::::

CALAMUS (Part 3) – tradução abaixo


WHOEVER you are holding me now in hand,
Without one thing all will be useless,
I give you fair warning, before you attempt me further,
I am not what you supposed, but far different.
Who is he that would become my follower?
Who would sign himself a candidate for my affections? Are you he?


The way is suspicious—the result slow, uncertain, may-be destructive;
You would have to give up all else—I alone would expect to be your God, sole and exclusive,
Your novitiate would even then be long and exhausting,
The whole past theory of your life, and all conformity to the lives around you, would have to be abandoned;
Therefore release me now, before troubling yourself any further—Let go your hand from my shoulders,
Put me down, and depart on your way.


Or else, only by stealth, in some wood, for trial,
Or back of a rock, in the open air,
(For in any roofed room of a house I emerge not—nor in company,
And in libraries I lie as one dumb, a gawk, or unborn, or dead,)
But just possibly with you on a high hill—first watching lest any person, for miles around, approach unawares,
Or possibly with you sailing at sea, or on the beach of the sea, or some quiet island,
Here to put your lips upon mine I permit you,
With the comrade´s long-dwelling kiss, or the new husband´s kiss,
For I am the new husband, and I am the comrade.


Or, if you will, thrusting me beneath your clothing,
Where I may feel the throbs of your heart, or rest upon your hip,
Carry me when you go forth over land or sea;
For thus, merely touching you, is enough—is best,
And thus, touching you, would I silently sleep and be carried eternally.


But these leaves conning, you con at peril,
For these leaves, and me, you will not understand,
They will elude you at first, and still more afterward—I will certainly elude you,
Even while you should think you had unquestionably caught me, behold!
Already you see I have escaped from you.


For it is not for what I have put into it that I have written this book,
Nor is it by reading it you will acquire it,
Nor do those know me best who admire me, and vauntingly praise me,
Nor will the candidates for my love, (unless at most a very few,) prove victorious,
Nor will my poems do good only—they will do just as much evil, perhaps more,
For all is useless without that which you may guess at many times and not hit—that which I hinted at,


Therefore release me, and depart on your way.



CALAMUS (Parte 3) Tradução J. Pontual


Seja você quem for segurando-me na mão,
Sem uma coisa tudo será inútil,
Aviso em tempo, antes que me insista,
Eu não sou o que você supôs, mas muito diferente.
Quem é aquele que se tornaria meu seguidor?
Quem se assinaria candidato às minhas afeições? Você é ele?


O caminho é suspicaz – o resultado lento, incerto, talvez destrutivo;
Você teria que desistir de tudo o mais – eu sozinho esperaria ser seu Deus, único e exclusivo,
Seu noviciado seria assim mesmo longo e exaustivo,
Toda a teoria passada da sua vida, e toda a conformidade às vidas ao seu redor, teriam que ser abandonadas;
Portanto solte-me agora, antes de se dar ao trabalho – Tire as mãos dos meus ombros,
Largue-me, e siga o seu caminho.


Ou senão, apenas de leve, nalgum bosque, para tentar,
Ou atrás de uma pedra, ao ar livre,
(Pois em qualquer aposento coberto de uma casa eu não me mostro – nem em companhia. E em bibliotecas deito como um mudo, um parvo, ou não nascido, ou morto)
Mas apenas talvez com você numa alta colina – primeiro vigiando para que ninguém, por milhas em torno, se aproxime despercebido,
Ou talvez com você velejando no mar, ou na praia do mar, ou alguma ilha calma,
Aqui botar seus lábios nos meus eu lhe permito,
Com o beijo demorado dos camaradas, ou o beijo do novo marido,
Pois eu sou o novo marido, e eu sou o camarada.


Ou, se quiser, me enfiando sob a sua roupa,
Onde eu possa sentir as batidas do seu coração, ou descansar no seu quadril,
Carregar-me quando atravessar terra ou mar;
Pois assim, apenas tocando você, é o bastante – é o melhor,
E assim, tocando você, eu dormiria em silêncio e seria levado eternamente.


Mas se você enganar estas folhas, corre perigo,
Pois estas folhas, e eu, você não entenderá,
Elas vão lhe escapar de pronto, e ainda mais depois – eu certamente vou lhe escapar,
Mesmo quando você ache que sem dúvida me pegou, cuidado!
Você já pode ver que eu lhe escapei.


Pois não é pelo que pus nele que escrevi este livro,
Nem é ao lê-lo que você irá adquiri-lo,
Nem aqueles que melhor me conhecem e admiram, e me elogiam com alarde,
Nem os candidatos ao meu amor, (a não ser no máximo pouquíssimos) serão vitoriosos,
Nem meus poemas farão só o bem – farão o mal também, talvez mais,
Pois tudo é inútil sem o que você pode ter pensado muitas vezes mas não atingido – o que eu insinuei,


Portanto larga-me, e segue o seu caminho.



SONG OF MYSELF (Parte 11)

Vinte e oito rapazes se banham perto da praia,
Vinte e oito rapazes e todos tão simpáticos;
Vinte e oito anos de vida feminil e todos tão solitários.
Ela é dona da fina casa na subida da margem,
Ela se esconde vistosa e ricamente trajada atrás da cortina da janela.
Qual dos rapazes que ela gosta mais?
Ah, o mais sem graça deles é lindo para ela.
Aonde vais, senhora? pois te vejo,
Saltas lá na água, contudo, estás estática em tua sala.
Dançando e rindo pela praia vinha o vigésimo-nono banhista,
Os demais não a viram, mas ela os viu e os amou.
As barbas dos rapazes cintilaram de umidade, ela escorria de seus longos cabelos,
Filetes deslizaram por todos os corpos.
Uma invista mão também deslizou sobre seus corpos,
Desceu trêmulamente pelas têmporas e costelas.
Os rapazes flutuam de costas, suas barrigas brancas incham para o sol, eles não indagam quem os agarra firme,
Eles não sabem quem ofega e declina num pendente e curvo arco,
Eles não pensam a quem encharcam com esguichos.


Em setembro, reestréia uma peça teatral em Curitiba sobre os poemas homoeróticos de Whitman.

Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

Redação Lado A

A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

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