O comportamento homofóbico ainda é um tanto controverso para ser corretamente delimitado, já que há tempos existe a discussão se tal comportamento, enquanto perturbação da personalidade, deve ser tratado como uma patologia e, dessa forma, considerado dentro de uma categoria diagnóstica nas classificações internacionais ou se os transtornos de personalidade já catalogados dão conta de identificar os sujeitos que apresentam tais distúrbios de conduta.
Atualmente, é usada na Psicologia Científica a denominação genérica transtorno antissocial da personalidade, podendo ser incluída nesta classificação o comportamento homofóbico, mas estudos recentes mostraram a necessidade de se diferenciar alguns tipos dentro dessa classificação para dar conta das variadas expressões do ato homofóbico que nem sempre é fácil de identificar.
Ainda não existe um instrumento científico válido que possa ser utilizado para identificar e avaliar tendências comportamentais homofóbicas, apesar de já haver certo consenso dentro da literatura psicológica especializada, especialmente nos estudos e pesquisas da Psicologia Afirmativa, sobre quem é e quais são as principais características do sujeito homofóbico prototípico.
Para os principais estudiosos do tema, o sujeito homofóbico prototípico é aquele portador de uma espécie de fobia, no sentido de aversão, repulsa, nojo, raiva ou medo irreprimível, em relação a pessoas homossexuais, manifestada normalmente de forma explícita, mas nem sempre, através de uma série de comportamentos e sentimentos negativos, especialmente antipatia, desprezo, preconceito, aversão, isolamento, invisibilidade, expressos, na maioria das vezes, através de atos preconceituosos explícitos e, muitas vezes, violentos.
A partir da minha experiência clínica no atendimento a pacientes homossexuais pude verificar que o sujeito homofóbico típico, caracterizado atualmente no meio forense a partir de uma face ativa, ou seja, como portador de um grupo de traços ou alterações de conduta manifestados em uma tendência ativa do comportamento, tais como avidez por estímulos, delinquência, descontrole comportamental, entre outros, caracterizam o tipo homofóbico ativo, responsável pela maioria dos atos de violência física contra os homossexuais, que eu denomino de tipo homofóbico explícito.
Porém esse não é o único tipo de sujeito homofóbico. Assim, a partir da minha atuação de mais de vinte anos como psicólogo no atendimento de pacientes, especialmente os homossexuais, e baseado na literatura especializada sobre o tema, criei a minha própria tipologia do comportamento homofóbico que pode ser categorizado em três subtipos: o indivíduo homofóbico explícito, já analisado anteriormente e o de mais fácil caracterização, uma vez que o seu ódio aos gays não deixa nenhuma dúvida; o homofóbico enrustido; e o homofóbico que eu denominei de “tolerante” (com aspas).
O homofóbico explícito é o tipo ativo, ou seja, não tem o menor pudor de colocar em ato a sua repulsa à homossexualidade e aos homossexuais. Baseado em crenças pessoais equivocadas ou pseudo-religiosas, justifica sua posição e faz questão de mostrar que a orientação homossexual, na sua visão, é uma patologia, uma anormalidade, uma “pouca vergonha”. O homofóbico explícito, muitas vezes, substitui o discurso sempre violento e explícito contra os gays (vide inúmeras páginas existentes na internet que divulgam o ódio aos homossexuais os tratando como aberrações ou doentes) por atos explícitos de violência homofóbica. Essa é a face mais ativa do comportamento homofóbico.
Porém existe a face passiva ou menos ativa do comportamento homofóbico, onde os atos homofóbicos são mais diluídos, líquidos, implícitos, ambíguos, e nem sempre fáceis de serem identificados por um leigo no assunto. Dentro do comportamento homofóbico “passivo”, muitas vezes travestido de “pacífico”, se escondem dois tipos de sujeitos homofóbicos: o enrustido e o “tolerante”.
O sujeito homofóbico enrustido não percebe, reconhece ou admite sua homofobia e seu comportamento homofóbico, justificando sua visão e atitudes na negação da existência da homofobia, no desinteresse em falar e discutir o assunto, e em uma série de atos-falhos que vazam o seu preconceito. Quando confrontado em relação ao seu comportamento homofóbico nega que ele exista, muitas vezes se irrita ou se ofende, e tenta convencer seu denunciante que a discussão da homofobia não é necessária, uma vez que a sociedade já estaria tratando do assunto com aceitação e normalidade. O homofóbico enrustido, de certa forma, não tem muita consciência de sua homofobia, estando impossibilitado muitas vezes, emocional ou cognitivamente, de admiti-la.
Na minha experiência dentro da clínica homoafetiva considero que o tipo mais difícil de identificar e o que tem causado o maior nível de violência psicológica e simbólica contra os homossexuais é o tipo homofóbico “tolerante”. Esse tipo se traveste de amigo dos gays, de simpatizante da causa gay, apesar de ter plena consciência de sua homofobia. Não quer ser identificado como uma pessoa preconceituosa ou intolerante, forçando um tipo de aceitação que de fato não existe. Na primeira oportunidade, de forma racional, não perde a oportunidade de sinalizar para os heterossexuais e para alguns homossexuais o quanto os gays se expõem desnecessariamente.
Para os homofóbicos “tolerantes” a “dignidade” que um indivíduo gay pode conquistar é ser percebido como um heterossexual (no que acreditam caracterizar o heterossexual típico), sem chamar atenção para a sua orientação de gênero ou sexual. Justificam que não há necessidade dos gays afirmarem sua diferença, uma vez que a sociedade ainda não está preparada e essa atitude somente traria prejuízos aos próprios gays. Oferecem-se como “protetores” dos gays, porém os homofóbicos “tolerantes” são anti-gays por excelência, têm a fantasia de que se todos os gays se assumirem vai acabar a orientação heterossexual na sociedade; muitos se sentem ameaçados por casais gays que não apresentam estereótipos e invejam inconscientemente a liberdade e felicidade que muitos gays e casais gays conquistaram por terem conseguido construir vidas e relacionamentos diferentes dos modelos heterossexuais clássicos.
SOBRE O AUTOR: Paulo Cogo é Psicólogo Especialista em Psicologia Transpessoal pela UNIPAZ, atuando nas áreas clínica e organizacional, dentro do enfoque da Psicologia Afirmativa; Doutor e Mestre em Sociologia pela UFRGS; Professor e pesquisador dos cursos de Psicologia, Comunicação Social e Design na UniRitter; Personal Coach nas áreas de planejamento e gestão de carreira.