Um jornalista percorreu os banheiros mais conhecidos em Curitiba onde tem pegação, além de parques, para ver como anda a famosa pegação em tempos de aplicativos. A constatação é que o perfil dos praticantes mudou, se comparado há 10 anos, e que hoje as pessoas formam grupos e os locais viraram espaços de convivência. A maioria, porém, continua a ser frequentada por enrustidos, pessoas comprometidas e oportunistas a fim de contato sexual sem compromisso.
Na internet, localizamos uma comunidade de “banheirão” do Paraná com atividades principalmente em Curitiba e Londrina. Por lá eles combinam encontros e dão dicas de locais, foi assim que chegamos a três locais distintos: os banheiros de um grande shopping na região Central, um shopping galeria ao lado de um famoso cursinho no Batel e o famoso banheiro público da Praça Osório. O grupo comenta ainda sobre banheiros de universidades, supermercados e terminais de ônibus, além de dicas para quem curte sexo casual.
Por lei, ato obsceno, artigo 233 do Código Penal, “A prática de ato obsceno em lugar público, aberto ou exposto ao público, é passível de pena de detenção de três meses a um ano”. Apesar das críticas, o que vimos foram pessoas que prezam pela discrição explorando um fetiche. Mas basta conversar com alguns para saber que muitas vezes é mais do que isso: é falta de dinheiro, necessidade de ser algo secreto, ou mesmo falta de aceitação do desejo homossexual ou medo de sofrer preconceito. É algo muito além da falta de vergonha ou obscenidade, como diz a sociedade e até muitas vezes os próprios gays que os condenam.
Parque Barigui
Esta pauta surgiu depois que recebemos a informação de que uma ação policial teria cercado a área de mata do parque onde ocorrem os encontros de pegação, no início deste mês, mas a informação acabou não confirmada no local. Mas, por lá, presenciamos muitos frequentadores em busca de sexo. As trilhas perto ao portal de Santa Felicidade reúnem quase que 24h por dia pessoas em busca de sexo. Pelos caminhos abertos na mata eles andam e mexem nos celulares, param um ao lado do outro para conversar, ou seguem por uma trilha menor e mais discreta, onde ocorrem os contatos. Não presenciamos a atividade em si, mas vimos que rola caça e muito flerte. E onde tem fumaça, tem fogo, neste caso muito fogo. Perguntamos para frequentadores do local e eles afirmaram que de dia é mais tranquilo para ir e que de noite há perigo de assaltos no local. Ao contrário do que se pensa, é durante a semana que há mais gente, no período da tarde. Frequentam o local desde jovens até senhores.
Shopping Curitiba
Apontado como um dos locais mais ativos, o local conta com quatro banheiros super vigiados. Mas isso não impede que o movimento seja intenso. Curiosamente, as portas dos reservados são quase transparentes e é possível ver toda a movimentação por meio das silhuetas, e vice versa. Observamos duas trocas de olhares de pessoas lado a lado no mictório e as pessoas, em seguida, saíram do local juntas. Segundo o grupo de pegação que usamos de base para esta matéria, é comum as pessoas trocarem carícias rápidas e irem para outro local, em busca de privacidade (saídas de emergência, carro ou fora do shopping, segundo os relatos). Perguntado à segurança do local, um deles afirmou que é raro os flagras no local mas que a prática é coibida e, caso seja constatado abuso, a segurança pede para as pessoas se retirarem do banheiro. Um dos serventes do banheiro afirmou que já encontrou preservativo no local. No local frequentam muitos novinhos, meia idade e bofes.
Shopping Omar
Apontado pelo grupo de pegação nos comentários do site “De Olho na Mala”, o local é o novo point da prática, com frequência de muitos boys. O banheiro do local, perto da praça de alimentação, é separado em mictórios e dois reservados de um lado, e os reservados do outro. Acompanhamos por cerca de 30 minutos a atividade do local e vimos apenas o entra e sai do banheiro. Como foi logo após a visita de um segurança, isso deve ter afastado os frequentadores. Mas, de fato, muitos homens e rapazes bonitos.
Banheiro da Praça Osório
Alvo recente de uma matéria na televisão que denunciava a prática do local, o point ainda é frequentado, embora esteja mais visado. Em nossa visita, vimos cinco pessoas no local. Um engravatado de saída, um jovem que saiu em seguida e dois homens de meia idade. Os olhares para quem entra e os olhares entre si denunciam que ali há um ambiente de camaradagem e muito mais do que mãos amigas.
O código interno destas pessoas é claro: discrição em primeiro lugar. O que acontece no banheiro, fica no banheiro. Nada de denunciar esse ou aquele frequentador. Deveria ser assim. Mas eles falam, principalmente quando encontram amigos ou namorados de amigos. Os “héteros” são os alvos prediletos, parece que o verdadeiro fetiche é pegar quem não parece ser gay, quem não frequenta o meio. É uma homofobia internalizada visível. Parece um álbum de figurinhas infinito onde pessoas viram prêmios. E tudo vira segredo.
Normalmente, os interessados em algo se posicionam em mictórios mais afastados e fingem urinar. Alguns já estão com membros em riste. Um dá uma olhada, o outro mostra, é a senha. Sem palavras, às vezes sem beijos, um toca o outro e um orgasmo rápido mútuo é planejado. Acabou. É como o sexo goy, entre machos, sem frescuras. Há aqueles que passam desta fase e vão para os reservados ou outros locais, arriscam o sexo oral, mas não é a maioria, o local raramente permite e o perigo é demais para muitos.
E falar sobre as doenças sexualmente transmissíveis e o perigo de ser fichado, ou acusado de um crime, são assuntos que não estão no dia a dia desta turma. É um escape da realidade, uma viagem a um mundo mágico no qual as pessoas perdem a identidade, brincam com o perigo e os limites sociais. É um parque de diversões em qualquer banheiro masculino, onde é possível encontrar prazer sem culpa, até que algo dê errado. E, acredite, a probabilidade de dar algo errado é grande. Mas talvez esse seja um dos motivos que tornam a prática viciante: a adrenalina de fazer algo proibido e perigoso.