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Minha avó não sabia…

Redação Lado A 22 de Julho, 2015 16h07m

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Vivemos das decisões feitas a cada momento. E, das decisões tomadas sem ponderar, me arrependo de uma em especial:
 
Quando minha avó materna ainda era viva e morava próximo a casa da minha mãe. Um de nós sempre levava comida e pão para ela. No último dia em que a vi viva, fui eu quem lhe levou pão. Meu objetivo era entregar as coisas da calçada mesmo, voltar para casa e continuar com minha maratona de seriados, largado no chão do quarto.
 
Lembro que, ao chegar no portão dela, falei “Não precisa abrir o portão. Não vou entrar”, ao que ela respondeu: “Tem certeza de que não quer entrar?”. Senti que havia algo no ar… Insegurança… Não sei. Mas ignorei isso e me ative ao plano original.
 
Poucos dias depois foi internada pela primeira – e última – vez num hospital. Ela estava com Câncer no intestino, mas minha mãe não nos contou isso. Ficou uma semana no pós-operatório e faleceu.
 
Não consegui sequer visitá-la, foi tudo rápido demais. Achei que era uma cirurgia simples, não sabia da gravidade do quadro. Fiz planos para visitá-la em casa e ajudaria com a recuperação.
 
Minha vó nunca foi exemplo de carinho e afeto. Era difícil. Reclamava de tudo e todos e afastou familiares e amigos de perto de si com essa postura. O fato de eu não entrar na casa dela aquele dia teve a ver com isso! Entre ouvir reclamações e ver seriados, escolhi seriados.
 
Mas, se eu soubesse que aquela seria a última vez em que sentaria com ela para ouvi-la, teria entrado. Hoje me arrependo.
 
Minha avó teve um papel importante durante meu crescimento, mas não sabia que eu sou gay. Sempre perguntou das minhas “namoradinhas” e quando ia levar alguma menina para conhecê-la.
 
Morreu sem ouvir da minha boca a verdade. Hoje ela sabe. Deve saber de tudo, até das coisas “erradas” que fiz. Espero que esteja bem. E que tudo isso continue servindo de lição para mim… Que sirva para me lembrar de que quando temos a chance de recomeçar, é melhor mudar do que permanecer nos erros. Melhor pensar em algumas necessidades dos outros antes do que pensar em nós mesmos. 
 
Mas, claro, pensar em si mesmo também é preciso. Não se abandone, não pense que no final de tudo a solidão será sua melhor amiga. A solidão não é boa, não.
 
Leandro escreve para doqueosgaysgostam.com e a vó dele ficaria de cabelos em pé se tivesse lido qualquer uma das respostas dele para o blog.
 
 
Redação Lado A

SOBRE O AUTOR

Redação Lado A

A Revista Lado A é a mais antiga revista impressa voltada ao público LGBT do Brasil, foi fundada em Curitiba, em 2005, pelo jornalista Allan Johan e venceu diversos prêmios. Curta nossa página no Facebook: http://www.fb.com/revistaladoa

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