Não existe sexo casual, gratuito ou sem compromisso

Allan Johan 26 de Junho, 2019 20h46m

Se engana quem opta por transar casualmente com estranhos ou com amigos para fugir das neuroses e amarras que envolvem a maioria dos relacionamentos. Pois sexo, necessariamente, envolve troca e expectativas. Saiba: Não existe almoço grátis, e nem janta, e muito menos café da manhã.

Quando duas pessoas se propõem a transar por livre vontade e “sem compromisso”, ambas entendem que farão o que é de comum acordo. Ou seja, tudo consentido mesmo que seja fetiche por sexo violento. Muitas vezes não conversam sobre mas subentende-se algumas coisas: que ninguém passará doença para ninguém, filmará o outro escondido ou revelará o que aconteceu a terceiros, expondo o outro ou outros. Há sim regras pré estabelecidas, como em um relacionamento monogâmico duradouro.

Já deu pra perceber que a ideia do “sem compromissos” é balela. Ainda mais se falarmos de compromisso sentimental, já que pode acontecer sim de uma das partes se apegar. É sempre um risco. E tudo estará sendo analisado, cada movimento, o próprio inclusive, cada post, palavra e olhada.

Automatizar o sexo a esse ponto e abrir mão da relação humana por trás desta experiência é se desumanizar. É elevar o sexo ao sentimento de tesão animal ao qual ao homem necessariamente passaria e passa pela consciência de seus atos. Analisamos prós e contras, riscos e benefícios, vantagens e desvantagens, automaticamente. Bloquear o outro no dia seguinte, virar o rosto, omitir a existência… mentir, uma traição… o prazer sobrepôs o sentido de respeito à dignidade da outra pessoa. E você pode sim ser a vítima, a qualquer momento. Pois você abriu mão das regras.

Relacionamentos podem parecer complicados. Se observarmos, que o respeito devido ao outro é o mesmo a um namorado, parente ou a um desconhecido, a noção de obrigação muda. Apesar dos dois afirmarem que o sexo é puramente carnal e não há compromisso, como fica o que não é dito? O não será respeitado? As dúvidas permanecem e igualmente os estresses comuns nos relacionamentos. Espera-se que o outro nos entenda.

Exageros

A atenção pelo corpo, pela frequência sexual, pela intensidade e tamanhos acaba virando uma obsessão e muitas pessoas entram em rotinas que prejudicam suas atividades. Resumindo, são horas em aplicativos, em conversas com intenção de levar ao sexo, listas de contatinhos alimentadas com falsos carinhos virtuais coletivos. Com isso, corações, ditos de saudades, tentativas de organizar agendas lotadas de sexo sem sentido. Para tudo isso vai tempo e custa muito. E tem ainda a gasolina, uber, comidinhas, aparatos e etc… O sexo acaba virando um vício, como o álcool ou o cigarro, preenchendo um vazio interior alimentado a cada nova experiência.

Tem gente que entra em obsessão pelo corpo perfeito, perde a referência. Se machuca com a rejeição recebida e reforça a cobrança por um padrão de beleza inatingível de forma natural. Usa drogas para compensar a baixo auto estima. Entra em desequilíbrio pois leva uma vida além da sua realidade. Mas o sentido de sucesso se confunde com a tabela de conquistas. Afinal, o esforço não pode ter sido em vão.

Ainda, quando nos lançamos em uma experiência com desconhecidos abrimos mão de nossa segurança em todos os sentidos. Isso porque presumimos que aquela pessoa tem boa índole. E como julgar o outro se reduzimos tudo ao tesão carnal? E se a pessoa for uma psicopata? Você permitiu ela entrar em sua vida. E se ela começar a se relacionar com seu melhor amigo ou tiver que lidar com ela no trabalho ou outro ambiente? Sim, a vida nos provoca a repensar as nossas certezas.

Se o corpo e o prazer viraram moedas de troca – casual e espontânea – o que garante a conversão destas expectativas? Seria o tesão do momento? E o depois? E os custos e riscos envolvidos?

O tempo

Um dia você esquecerá com quantas pessoas e com quem transou. E se foi bom ou não.  Pois tudo se apagará para dar lugar às experiências verdadeiras e importantes que você teve. Talvez você não as viva nunca. Seu corpo e mente podem estar preocupados demais com o efêmero. E um dia percebe que você não se preparou para a velhice. Ou seja, quando a juventude se esvair ou não for mais tão sexualmente atraente. Onde estarão os amigos não cultivados? Aqueles que você abandonou por uma transa…

Sim, há muitos custos quando você amplia seu leque de parceiros sexuais. Já que, além da carga emocional, de bactérias e vírus envolvidos, você deixa de olhar para alguém. Logo, o tempo que você deixa de se dedicar a outra pessoa porque estava trocando algo possivelmente verdadeiro por sexo casual. Isso tem um preço. E o tempo é o preço mais caro. Então, por mais que a vida diária gere custos, e pareça que temos que aproveitar a curta vida, o tempo é que define o que você deixou de plantar, o que lhe custou. Aquilo que você não viveu é o mais caro. Pois só colhe o que se planta, então, pense no que você tem plantado. Será colhido exatamente aquilo que plantou.

 

Allan Johan

SOBRE O AUTOR

Allan Johan

O jornalista Allan Johan é fundador da Revista Lado A, militante LGBTI e primeiro Coordenador da Diversidade Sexual da Prefeitura Municipal de Curitiba entre março de 2017 até maio de 2020.


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